São Paulo, domingo, 9 de abril de 1995
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Saúde papal esquenta debate sucessório

HUMBERTO SACCOMANDI
DA REPORTAGEM LOCAL

O precário estado de saúde do papa João Paulo 2º no final do ano passado fez surgir, dentro e fora dos muros do Vaticano, uma acalorada discussão sobre a sua sucessão no vértice da Igreja Católica.
Aos 74 anos, o papa vem dando evidentes sinais de fadiga. Há meses ele tem dificuldade para ficar de pé. Aparecendo quase sempre amparado por uma bengala.
Eventos longos também arrancam dele expressões de sofrimento, como na Croácia em 1994.
Mesmo os passeios pelo campo, um dos passatempos preferidos do papa, praticamente acabaram.
A fragilidade do papa não se explica somente pela sua idade. É preciso lembrar que ele já foi baleado, operado de um tumor e sofreu quedas que provocaram fraturas (veja quadro nesta página).
Os rumores de que o estado de saúde do papa seria grave cresceram no final de 94. Foram alimentados pelo cancelamento, em setembro, de uma importante visita aos Estados Unidos.
"Nesse aspecto -e em outros, aliás- o Vaticano lembra a antiga União Soviética. Trata-se de um Estado fechado, no qual as informações sobre o comando supremo são sempre inconclusivas, referidas ou inferidas via sinais em código", disse à Folha o vaticanista italiano Marco Politi.
Costuma-se dizer que um papa nunca está oficialmente doente até que ele esteja oficialmente morto.
Assim, qualquer movimento extraordinário no Vaticano vinha sendo considerado um sinal de que o papa estava agonizando.
Não estava. Mas sem dúvida 1995 começou no Vaticano com um clima de fim de regime. Isso apesar de João Paulo 2º já estar fazendo planos para o ano 2000.
Especialistas laicos e católicos deram então início a um intrincado jogo de apostas e manobras com os possíveis candidatos.
Entre os mais citados como "papabili" (papáveis) pelos vaticanistas está um brasileiro, dom Lucas Moreira Neves, arcebispo de Salvador. Outros são os arcebispos italianos Carlo Maria Martini (Milão), Giacomo Biffi (Bolonha), Giovanni Saldarini (Turim) e o nigeriano Francis Arinze.
As cotações são estabelecidas a partir de muitas inferências subjetivas quanto critérios como nacionalidade, saúde, trânsito no Vaticano, ordem religiosa etc.
Mas conta um importante fator objetivo: a composição do Colégio dos Cardeais, que elege o papa. João Paulo 2º, em seus quase 17 anos de pontificado, renovou a cúpula da igreja.
Ele indicou 103 dos 120 cardeais que formam esse colégio eleitoral, dando a ele um caráter ainda mais conservador do que em 1978, quanto o então arcebispo de Cracóvia foi eleito.
Isso não significa, porém, que o ultraconservador arcebispo Biffi terá vitória fácil. Nem que o mais liberal Martini está fora do páreo.
A eleição de um papa -sem candidaturas oficiais, sem propaganda, sem programas de governo- é um fenômeno estranho, sem paralelo no mundo secular.
Nesse contexto, o arcebispo brasileiro pode aparecer como um candidato de compromisso, disse a revista italiana "Panorama".
Além disso, a eleição do polonês Karol Wojtyla em 78 (primeiro papa não italiano em mais de 450 anos) é considerada pelos vaticanistas como o fim da predominância italiana no papado. A internacionalização da Igreja foi, aliás, um dos marcos do seu pontificado.

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