São Paulo, domingo, 23 de abril de 1995
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Estudante vê crime, leva 6 tiros e fica paralítico

MG
DA REPORTAGEM LOCAL

O estudante V.J.F., 15, viu sete pessoas deitadas na calçada quando chegava em casa. Ao redor delas, seis homens armados. O estudante ficou olhando até que um dos homens teria dito: "Você também. Vai lá e deita."
V.J.F. levou seis tiros. Ficou 15 dias no hospital. Uma das balas não foi retirada. Continua em seu peito e causa febres. Outra atingiu a coluna. Ele está em uma cadeira de rodas com as pernas paralisadas. A família do estudante mudou de cidade. V.J.F. faz fisioterapia.
O estudante havia ido a um jogo de futebol no bairro. Os matadores não o queriam como testemunha da chacina da rua professor Carlos da Silveira, em Cangaíba (zona leste de SP).
Outra testemunha da chacina, Siderval de Almeida, 18, o "Quinha", estava conversando com seu amigo Edmilson de Oliveira, 18, a 20 metros da casa de V.J.F. na madrugada de 18 de fevereiro. Perto deles, cinco pessoas fumavam crack. Oliveira nunca teria experimentado crack. Quinha sim. "Fumei uma vez e não gostei."
Um Opala e um Monza pararam perto do grupo que fumava crack. "A 'pedrinha' (crack) dominou o bairro", diz Quinha.
Desceram seis homens dos carros. "Polícia! Mão na parede. Aqui é o Denarc (Departamento de Narcóticos)", teriam gritado.
Chamaram Quinha e Oliveira. Eles foram postos pelos homens que se diziam policiais junto aos cinco que fumavam as "pedras".
"Revistaram a gente." Ordenaram que os sete deitassem no chão. O último a se juntar ao grupo foi V.J.F.. Quinha ficou de lado. Não deitou. Quando ouviu o primeiro tiro, levantou e correu.
Quatro pessoas que ficaram deitadas morreram -entre elas, Oliveira. Três sobreviveram com seis a oito tiros no corpo.
Quinha levou quatro tiros. Passou sete dias no hospital. As balas atravessaram seu corpo e deixaram marcas no peito, no pescoço, nas costas, na mão e na perna.
Quinha vive com medo. Acorda de noite sonhando com os matadores. Ele mudou de casa. Está desempregado. "Dos baleados, eu conhecia o Chalita e o Robson."
Sérgio Ferreira de Souza, 21, o Chalita, "andava armado e fumava (crack)". Quinha o conhecia desde criança. Chalita morreu. "Ele pegava ônibus comigo. Eu ia trabalhar e ele ia roubar."
Robson Oliveira, 20, levou sete tiros -três na cabeça. Sobreviveu, passou a frequentar uma igreja evangélica e, segundo Quinha, nunca mais fumou crack.

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