São Paulo, sábado, 29 de abril de 1995
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Antes que se apague a luz

PETER GREINER

Tarifas são preços regulamentados e fiscalizados pelo governo. Devem representar o justo custo operacional e a remuneração do capital investido na prestação de um serviço eficiente e confiável. Seria leviano falar em aumento ou redução imediata das atuais tarifas elétricas, por estas representarem valores aleatórios pouco representativos dos custos.
Isto porque os sucessivos governos, como administradores diretos das concessionárias de energia, viram-se livres para atropelar e desrespeitar a própria legislação e regulamentação das tarifas, o que se constitui numa das questões que o atual governo se propõe resolver.
Sob o pretexto de combater a inflação, chegou-se a congelar a tarifa média em US$ 34 por MWh, quando esta deveria ser de US$ 70, deixando-se ao consumidor o ônus de arcar com as inevitáveis compensações futuras ou, ao contribuinte, o encargo de cobrir, via impostos, o déficit provocado nas estatais, que, transferido ao tesouro, provoca o endividamento do Estado.
Estranhamente, ninguém se dá conta de que os pesados investimentos estatais no setor elétrico favoreceram o capital privado, ao qual também são destinados 70% da energia (indústria e comércio) contra apenas 24% consumidos pela população. Os investimentos estatais no setor de energia elétrica acabam por configurar um processo de concentração de renda num valor que, pasmem, é superior a US$ 8 bilhões por ano!
A participação privada proposta pelo governo deverá, portanto, levar a uma melhor distribuição da renda. Mais do que isto, ela não é um fim em si ou uma tese ideológica.
A privatização, como a entendemos, subordina-se a um objetivo maior que é o de estabelecer um regime de competição eficaz e, por meio dela, obter uma alocação mais eficiente dos escassos recursos de capital de que dispomos.
Além disso, permite tornar o Estado mais enxuto e muito mais forte no seu papel de regulador do mercado na medida em que, de agente comprometido, se transforma em juiz e fiscal.
Melhor do que esperar sentado até que se apague a luz ou que "sucessivas administrações públicas eficientes e probas" reduzam os custos das estatais e estas readquiram sua capacidade de investimento, é confrontá-las com a competição e admitir a participação de capitais de risco. Para tanto, é indispensável a privatização de, pelo menos, boa parte do sistema.
Num mercado competitivo será eliminada uma série de sobrecustos que caracterizam o modelo de investimentos estatais: o inchaço dos quadros, a escolha política dos projetos em desacordo com a racionalidade econômica, eventuais superfaturamentos e contratação de serviços desnecessários ou viciados, os custos da descontinuidade de gestões políticas e de seu efeito devastador sobre os quadros profissionais.
Mais do que isto, a iniciativa privada deverá agilizar a introdução de novas opções tecnológicas, a favor da economia e da racionalidade.
O fato insofismável de o Estado não dispor da capacidade de arcar com os investimentos necessários para continuar a expandir os serviços torna irrelevante a discussão de privatizar ou não, devendo o eixo das discussões ser deslocado sobre o modelo de organização do mercado que permita realizar o potencial de redução de todos os custos diretos e indiretos, que não são contemplados pelas tarifas vigentes.

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