São Paulo, segunda-feira, 8 de maio de 1995
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O setor privado na concessão de serviços públicos

ÁLVARO NOVIS

A participação do setor privado em projetos de infra-estrutura é fundamental no contexto atual brasileiro. O tema, não é novo para inúmeros países, sejam desenvolvidos ou economias emergentes, que têm se utilizado do modelo de concessões privadas em diferentes setores da economia.
A comunidade internacional tem exemplos concretos e bem-sucedidos de projetos apoiados por capitais privados, a grande maioria possíveis por meio de esquemas financeiros criativos e inovadores.
Nos mais diferentes regimes políticos, áreas de transporte, energia, águas e esgotos, são de responsabilidade de empresas privadas. Esquemas de financiamentos via empréstimos e captação de recursos no mercado internacional têm-se revelado determinantes para o crescimento do mercado de concessões no mundo.
No Brasil, o conceito de concessão é antigo, mas a participação do setor privado é limitada por legislação pouco consistente e fragmentada. Com a promulgação da Lei de Concessões (lei 8.987/95), em fevereiro, o Brasil passará a oferecer, em bases seletivas, oportunidades atraentes de retorno para investidores e financiadores.
Ao tratar desse tema, contudo, vale ressaltar a diferença entre concessão de serviço público e privatização. Nesta última, o objetivo do governo é vender ativos, deixando, assim, de envolver-se na condução e riscos inerentes à empresa privatizada. Já na concessão, o governo negocia o direito de operar e explorar um serviço público, por determinado período de tempo, após o qual a concessão reverte ao governo.
Os direitos e obrigações do concessionário e do poder concedente são, claramente, regulados no contrato de concessão e outros documentos pertinentes. No exercício de seu direito inalienável de soberania, o governo pode terminar, resgatar ou denunciar o contrato antes do prazo acordado, dentro de certas circunstâncias.
Enfatize-se que o governo, parceiro do setor privado e principal guardião dos interesses dos usuários do serviço público, deve exigir que a concessão seja corretamente operada, seja eficiente e lucrativa.
A arquitetura contratual, entretanto, é fator essencial para atrair o interesse do setor privado e cria bases para que o projeto seja financiável sob as óticas política, técnica e econômica. Não deve ser interesse do governo, ao negociar o contrato, transferir riscos indevidos ao concessionário. A melhor alocação de riscos é a que os aloca onde possam ser competentemente geridos e absorvidos, contribuindo para reduzir os custos do projeto.
O processo de concessão inicia-se no momento em que o governo anuncia e adere à sua decisão política e ao seu compromisso de compartilhar com o setor privado a responsabilidade de desenvolver um projeto de concessão. Essa decisão e compromisso político é a sustentação de todo o processo.
Abrange a formulação do edital de licitação, a seleção do melhor candidato, a negociação dos termos do contrato, prosseguindo-se por uma realística e equitativa supervisão pelo governo da operação do bem público durante todo o período de concessão. A decisão política deve assegurar leis e regulamentos estáveis que venham a atrair parceiros privados competentes e sérios, em uma parceria que deverá durar 20 ou mais anos.
A experiência de outros países ensina que entre desafios a superar está o de se financiar em bases de risco-projeto os investimentos na concessão. Financiadores devem estar preparados para aceitar a geração de caixa como única fonte pagadora dos empréstimos concedidos.
Essa prática permitirá aos patrocinadores privados assumir riscos e dedicar sua capacidade empresarial para desenvolver, simultaneamente, mais de um projeto de concessão, multiplicando, assim, as oportunidades nessa área. Consciente disto, a direção do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) tem-se empenhado em examinar ajustes na sua política de crédito que venham ao encontro dessa necessidade de se aceitar e estimular a prática de ``project finance".
Como catalisador no mercado financeiro, o BNDES deve promover os conceitos do ``project finance", estimulando instituições financeiras privadas a multiplicar a oferta de recursos, baseada na garantia do fluxo de caixa e do risco do projeto.
Recursos em moeda local são fator crítico para programas de concessões privadas. Papel importante, senão decisivo, poderá ser desempenhado pelos fundos de pensão no Brasil e, no futuro, aqueles dos países do Mercosul. Estimativas falam de recursos no Brasil da ordem de R$ 180 bilhões no ano 2000. Se adicionarmos os de fundos do Chile e Argentina, chegaremos a R$ 280 bilhões.
Parece-nos inevitável se considerar tal disponibilidade como parte relevante da solução para a enorme demanda de infra-estrutura no Brasil. No setor energético, por exemplo, serão necessários investimentos de R$ 30 bilhões nos próximos quatro anos. Desta forma, mecanismos de acesso a esses recursos urgem serem criados.
Por fim, o sucesso de um projeto de concessão tem de estar alicerçado em adequada distribuição de riscos e retornos a todos aqueles que dele participem, sejam com capital de risco, sejam como financiadores -o que será possível com parâmetros políticos, técnicos e econômicos que assegurem o fluxo de caixa positivo, sustentado por adequada capitalização da empresa concessionária e de um plano de seguros que venha a cobrir riscos de difícil quantificação.
O governo está determinado a encorajar o setor privado a participar do esforço de remodelação e construção da infra-estrutura brasileira, através de programas de concessões e de privatizações.
Ao setor privado cabe criar condições técnicas e de mercado indispensáveis para o deslanche e a concretização das várias iniciativas públicas e privadas.
A nossa proposta é a de caminhar junto com o governo, dialogando e fazendo acontecer, na certeza de que o apoio da sociedade virá, avalizando e aplaudindo todo esse empenho, pois os resultados reverterão em seu benefício.

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