São Paulo, terça-feira, 9 de maio de 1995
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Bella matribus detestata

Guerras não são novidade na história humana. Sempre trouxeram consigo seu quinhão de dor e sofrimento. Sempre cobraram seu preço em vidas, em geral, dos mais jovens. Nos 50 anos anteriores à Era Cristã, o poeta Horácio já escrevera: ``Bella matribus detestata..." (As guerras detestadas pelas mães...).
Ontem, 8 de maio, celebrou-se o cinquentenário do Dia da Vitória, a capitulação total da Alemanha nazista, o que praticamente pôs fim ao maior conflito bélico a que o mundo já assistiu. A Segunda Guerra, porém, não foi apenas o maior e mais mortífero combate militar da história. Ela foi, e é, a maior mácula que pesa sobre a humanidade.
Dotado de alta tecnologia e organização, inspirado pelo ódio racial de alguns e pela conivência de muitos, e apoiado num sistema totalitário que apagou qualquer vestígio de democracia, o regime nazista mostrou ao mundo a banalidade com a qual se pode fazer o mal.
Mais do que apenas conquistar territórios e riquezas como nas guerras tradicionais, Hitler e seus sequazes decidiram também extirpar povos e grupos pelos quais nutriam um ódio irracional. A eliminação em escala industrial de cerca de 6 milhões de judeus apenas por serem judeus -fossem mulheres, crianças ou velhos-, bem como de outras minorias, não encontra paralelo na história.
Os indícios de que o Holocausto não foi obra apenas dos delirantes membros da Gestapo e das SS, mas que também a ``Wehrmacht", o corpo regular do Exército alemão, participou das atrocidades, reforçam a tese da banalização da morte, de que mesmo o homem comum, equilibrado e pai de família pode, de uma hora para a outra, transformar-se numa fera assassina.
A data ontem celebrada é de fato um marco na história. Pôs-se fim à pior e mais sanguinária ditadura do planeta em todos os tempos. Não se pode esquecer, porém, que houve exageros da outra parte. Ao aceitar como legítimos os bombardeios a alvos civis, inclusive com dois artefatos atômicos, os aliados também contribuíram para o embrutecimento dos conflitos.
A Segunda Guerra mostrou que o homem, apesar de todas as suas conquistas tecnológicas e artísticas, ainda guarda dentro de si uma natureza bestial. Falta um poeta como Horácio para descrever, em tão poucas palavras, todos os horrores do conflito que dizimou a vida de 50 milhões de pessoas -a maioria civis. A memória, o não esquecimento, é fundamental para que fatos como esse não se repitam.

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