São Paulo, quarta-feira, 10 de maio de 1995
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Despedidas tiram a graça do Paulista

ALBERTO HELENA JR.
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

O futebol paulista está perdendo a graça. Ou, pelo menos, parte dela, com as despedidas de Edmundo e Viola.
Edmundo, quando abre a boca, não tem graça nenhuma. Provoca lágrimas... de ódio ou de desespero quanto ao futuro da raça humana. Mas, com a bola nos pés, ilumina um Morumbi mergulhado em trevas só com o sorriso da galera.
Ainda ontem, ouvi de Cláudio Carsughi uma definição correta: para o Palmeiras de hoje, Edmundo é essencial; mas, no Santos de Pelé, seria reserva. A rigor, Edmundo talvez tenha mais defeitos que virtudes, dentro das quatro linhas. Seu senso de solidariedade é zero, e ele próprio me confessou que seu maior problema é no arremesso final a gol.
Na verdade, Edmundo pertence a uma estirpe de jogadores solitários, que só conseguem ter afinidade íntima, e até compulsiva, com a bola. Ele e a bola, fim. Ou o começo de um ato que oscila entre a comédia e a tragédia: se está num dia propício, desmonta qualquer retranca, pois, com seus dribles desmoralizantes, extrai de cada adversário a alma de vencedor, inoculando-lhes o pior de todos os sentimentos: a humilhação.
Nessas ocasiões, faz-me lembrar um pouco de Mané Garrincha, de Luisinho Trujillo. Só que, ao contrário dessas doces personalidades, tem um gênio do cão. E é isso que transforma a comédia em tragédia, ou num cinzento drama B.
Já Viola, não. Viola costumava ser um sarro, dentro e fora das quatro linhas, isso antes de essa história da transferência para a Espanha confundir-lhe as ações, os sentimentos e os pensamentos, como diria o poetinha. Sim, porque sua vertiginosa queda de produção, da Copa até aqui, só pode ser creditada ao conflito causado pela expectativa de sua saída. Entre o desejo de viver sua vidinha de zona leste, rei do Parque, e colher um pote de ouro ao pé do arco-íris, o coração corintiano e paroquial de Viola balança ainda. Não fosse isso, e teríamos aquele mesmo espetáculo de antes da Copa: antes de tudo um goleador, capaz, também, de adornar suas jogadas com lances de inventiva originalidade, além de derramar sangue e suor pelo gramado. Para arrematar, as coreografias que se seguiam a cada gol, coletivas, como a enfatizar seu espírito de corintiana solidariedade.
Partem Edmundo e Viola. Mas ambos deixam a certeza de que ainda há lugar para a individualidade neste futebol que tanto flerta com a robotização.

O Japão não faz mal apenas ao orgulho norte-americano. Em muitos casos, tem desviado nossos craques de seu destino. Digo isso pensando em Bentinho, que, se não tivesse vivido o hiato japonês; se tivesse se transferido direto da Lusa para o tricolor, por certo, se anteciparia a Túlio na seleção, e hoje seria xodó do Zagallo. Isso porque é um centroavante jovem, com mais recursos técnicos e quase a mesma eficiência na área. Agora, terá de cumprir um caminho mais tortuoso. Talvez, para nunca chegar ao seu destino.

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