São Paulo, segunda-feira, 15 de maio de 1995
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Engraxando as chuteiras

ROBERTO MACHADO
DA SUCURSAL DO RIO

Nivaldo Ferreira, 13, há quatro meses era engraxate em Volta Redonda (a 134 km do Rio) e hoje é uma das maiores promessas do Centro de Futebol Zico.
O Centro é uma escolinha de futebol para crianças de 6 a 16 anos dirigida pelo ex-jogador do Flamengo, da Udinese (Itália), do Kashima Antlers (Japão) e da Seleção Brasileira.
Nivaldo saiu sozinho de Volta Redonda em janeiro, pegou um ônibus para o Rio, conseguiu chegar até o Recreio dos Bandeirantes (zona sul) e se inscreveu na primeira turma para crianças de 12 a 14 anos.
``Quando o Nivaldo chegou aqui, sozinho, carregando a sua caixinha de engraxate, e disse que vinha de Volta Redonda, eu não acreditei", disse o funcionário Josué Rocha, que recebeu Nivaldo no Centro e se tornou um de seus melhores amigos no Rio.
Nivaldo soube que Zico abriria uma escolinha de futebol em janeiro. Ele trabalhava como engraxate na porta de um hotel em Volta Redonda. E comentou com um dos seus clientes, o funcionário da Secretaria Estadual de Fazenda Sérgio Paesler.
Depois de se inscrever, Nivaldo ligou para Paesler, que resolveu ``adotar" o menino.
atualmente, Nivaldo mora durante a semana com a família de Paesler, em Ipanema (zona sul), e às sextas, pela tarde, vai para Volta Redonda.
``Conseguimos uma vaga para ele numa escola e Nivaldo voltou a estudar (está na segunda série). Além disso, contratamos uma professora particular para ajudá-lo", afirmou Patrícia Bonomo, mulher de Paesler.
Patrícia leva Nivaldo todas as manhãs, de segunda a quinta, até o Centro de Futebol Zico. À tarde, vai buscar o menino na escola. Para ela, Nivaldo ``é mais um membro da família".
Nivaldo é órfão de pai. A mãe, Maria Ferreira da Silva, 42, está desempregada. O padrasto Laerte Oliveira, 31, trabalha numa oficina mecânica. Nivaldo tem sete irmãos, alguns trabalhando como engraxates.
O instrutor Paulo César Pereira, 32, disse que Nivaldo tem muita garra e velocidade. ``Vamos posicioná-lo do meio-campo para a frente", afirmou.
Segundo Pereira, a maior dificuldade de Nivaldo foi vencer a ``agressividade". ``Nos primeiros treinos, marcava muitas faltas. Mas nós conversamos e ele já amadureceu bastante", disse.
Nivaldo reconhece que joga com vontade. ``Sou pegador mesmo. Mas não entro para machucar", afirmou.
Paesler e Bonomo providenciaram médico, nutricionista e psicólogo para o ex-engraxate, que trabalhava doze horas por dia nas ruas de Volta Redonda.
``Se amanhã, Nivaldo não for jogador de futebol, ele será um adulto apto para trabalhar. É isso que achamos importante", afirmou Bonomo.
Mas, para Nivaldo, o seu destino está assegurado. ``Serei jogador de futebol. É o meu maior sonho", afirmou.

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