São Paulo, domingo, 21 de maio de 1995
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Técnico da Itália elogia seleção brasileira

MATINAS SUZUKI JR.
ENVIADO ESPECIAL A TURIM

Encontro com o técnico da seleção italiana Arrigo Sacchi no saguão do hotel em que me hospedava em Milão, no norte da Itália.
Ele estava na cidade onde, como técnico do Milan, construiu um time que entrou para a história das revoluções no futebol.
Veio para ver o jogo em que o Parma, pela primeira vez, sagrou-se campeão da Uefa, ao empatar com a Juventus, de Turim.
Depois da derrota para o Brasil no final da Copa, o futebol italiano volta a sorrir. O Parma já ficou com o título da Uefa.
E o seu ex-Milan disputa, na próxima quarta, a final da Copa dos Campeões da Europa, na Áustria, contra o Ajax, de Amsterdã.
Interrompo a sua conversa com alguns amigos para solicitar a entrevista que se segue. Sacchi, afável, concorda imediatamente.
Poucos times deram tanto prazer para se ver como o de Sacchi e seus holandeses voadores (Van Basten, Gullit e Rijkaard).
Arrigo Sacchi, nos anos 80, emprestou consistência ao mito romântico do futebol total da seleção holandesa da década de 70.
Seus princípios de marcação ativa, de pressão em zonas determinadas do campo, de diminuição do espaço de jogo para o adversário são, hoje, largamente utilizados.

Folha - Quase um ano depois, como o sr. avalia a derrota da seleção italiana para o Brasil na final da Copa dos EUA?
Arrigo Sacchi - Eu me sinto bem melhor do que esperava. De qualquer forma, penso que o Brasil mereceu ganhar a Copa.
Folha - Perder a final é ruim, perdê-la em disputa de pênaltis tem um componente trágico...
Sacchi - (interrompendo) É terrível perder quando se joga melhor do que o adversário. Mas, se você não estava jogando melhor, não é tão difícil perder.
Folha - Os críticos dizem que aquela não foi uma vitória do verdadeiro estilo do futebol brasileiro. O que o sr. pensa disso?
Sacchi - O time era dos mais organizados taticamente da história do futebol brasileiro. Dava pouquíssima vantagem ao oponente. Atuava em ``pressing" e era extremamente eficiente na marcação, o que é muito mais do que se basear apenas na individualidade.
Seu futebol se baseava na organização do jogo, a despeito da inacreditável habilidade de seus jogadores. Todos jogavam para o time.
Folha - Na sua opinião, quais foram os jogadores que mais se destacaram nesse time?
Sacchi - No Mundial, o Romário foi muito importante. Além dele, Dunga, Mauro (Silva), Jorginho e ainda o Mazinho.
Folha - O sr. foi criticado por ter usado muitos jogadores, tanto na preparação como na Copa. Como explicar este expediente?
Sacchi - Na Itália existem muitos jogadores eficientes. Precisava usar os que estavam em forma. Escolhia-os segundo as possibilidades de enfrentar cada adversário.
Folha - O grande Milan da era Sacchi tinha um padrão revolucionário. Por que a seleção não conseguiu o mesmo nível?
Sacchi - O Milan é um clube. Quando era técnico do Milan, a gente treinava 400 ou 450 vezes por ano. É óbvio que era uma equipe com uma especial característica própria. Na seleção, a gente faz 40 ou 50 treinos por ano.
Os conceitos são os mesmos para os dois. Mas não há a continuidade, que é fundamental.
Folha - Parece que há uma grande confusão no mundo das táticas. Ninguém mais usa um ``puro" 4-4-2 ou um ``puro" 3-5-2.
Sacchi - O futebol não deveria ser considerado em termos de números. Estes esquemas restringem a cultura do futebol.
Eu prefiro considerar que o futebol do futuro será um futebol mais dinâmico. Se nos fixarmos nestes esquemas, ficaremos restritos a um futebol estático. E este não será um futebol espetáculo.
Folha - O sr. acha que o conceito da pressão por zona, do qual o sr. é um dos formuladores, permanece vivo?
Sacchi - Eu acho que você não pode pensar o futebol somente sob um aspecto. Eu insisto: o futebol caminha para ser um futebol sempre mais dinâmico, sempre mais veloz, sempre mais organizado.
Os jogadores também terão que ser cada vez mais profissionais, cada vez mais cultos e com uma visão cada vez mais global de todo o evento futebolístico. Terão que ser cada vez menos específicos.
Folha - O Milan de Fabio Capello está sendo muito criticado.
Mesmo assim, está na final da Copa dos Campeões deste ano e a conquistou magistralmente em 94, com uma vitória acachapante sobre o Barcelona, de Cruyff. Como o sr. vê o Milan de hoje?
Sacchi - É ainda um grande time, mas um pouco estático.
Folha - E sobre o jogo do Milan contra o Ajax na final da Copa dos Campeões da Europa?
Sacchi - Espero que seja um grande jogo. Penso que o Ajax, no aspecto individual, é menos experiente. Mas é um time que poderá ser mais dinâmico.
Folha - O Ajax faz uma campanha sensacional este ano. Ele é o Milan de ontem?
Sacchi - Cada time tem a sua época. Depois dela, é superado.
Folha - Novamente o Milan é a referência. Fala-se muito na Itália que a nova Juventus, de Marcelo Lippi, lembra o Milan, de Sacchi. Isto é verdadeiro?
Sacchi - Na dinâmica, na agressividade, na maneira de cercar o adversário e também de diminuir os espaços, eu acho que sim.
Folha - Qual o melhor jogador italiano da atualidade?
Sacchi - Eu acho que Zola (do Parma) é o número 1.
Folha - E entre os ``estrangeiros" que atuam na Itália?
Sacchi - Savicevic (Milan).
Folha - O sr. acompanha a seleção brasileira pós-Copa?
Sacchi - Ainda sou treinador da seleção italiana (risos). Mas acho que devo dizer algumas palavras.
Sempre apreciei o futebol brasileiro. Se é necessário que eu perca um Mundial, se não há alternativa, fico feliz que seja para o Brasil.

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