São Paulo, segunda-feira, 22 de maio de 1995
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Brizola defende união do PDT com PT

AZIZ FILHO
DA SUCURSAL DO RIO

Aos 73 anos de idade e sete meses após sua derrota nas eleições presidenciais, Leonel Brizola, presidente do PDT, comemora o cinquentenário do trabalhismo defendendo a união de seu partido com o PT de Luiz Inácio Lula da Silva.
Brizola foi um dos fundadores do PTB, criado em 1945 com o apoio do então presidente Getúlio Vargas para canalizar as reivindicações dos trabalhadores urbanos.
Cinquenta anos depois, com as mesmas idéias nacionalistas do velho PTB, Brizola diz que ``só com o socialismo a humanidade vai resolver seus problemas".
PT e PDT, segundo Brizola, devem ter um candidato único à sucessão de Fernando Henrique, ``quase que obrigatoriamente". O ex-governador, que sempre citou a Austrália como modelo, agora se mostra encantado com a China.

Folha - O que mudou na doutrina do trabalhismo de Getúlio Vargas até hoje?
Leonel Brizola - Em relação àquele tempo, ampliou-se a visão do que seja o trabalhismo. Eram posições nacionalistas e em relação aos direitos sociais. Não havia visão abrangente, como hoje, do mundo e dos interesses nacionais.
Folha - Aos 50 anos, o trabalhismo agoniza ou se recicla?
Brizola - Vivemos um momento crucial. Tivemos o acidente com a sigla do PTB, que nos prejudicou muito, mas nos depurou. Ela é um instrumento das oligarquias conservadoras. Tem na presidência um banqueiro, o Andrade Vieira, que se refere ao PTB como ao Ministério da Agricultura. Entra e diz: ``Ninguém me tira daqui, eu comprei isto". Ele comprou o partido, que não é um partido. É apêndice dum governo cuja preocupação é extinguir a era Vargas.
Folha - Na reforma eleitoral, o PDT pode reaver a velha sigla?
Brizola - Abandonamos totalmente a idéia de voltar a usar a sigla. Se pudermos, vamos recolhê-la para colocar no museu, ter ali como uma expressão de uma fase de nossa vida. O trabalhismo de hoje expressa o que procuramos definir na reunião de Lisboa. Somos o autêntico caminho brasileiro para o socialismo democrático.
Folha - O que prejudicou mais o trabalhismo: o regime militar ou o surgimento do PT?
Brizola - O PT surgiu sob a cobertura do regime militar. É um rebento, uma planta exótica que surgiu na estufa da ditadura, procurando nos rebentar justamente onde deveríamos ter nossa maior base, que era São Paulo.
Quebraram muito as nossas perspectivas com a ocupação do espaço sindical. Mas faz parte do processo social. Hoje acho que o PT adquiriu uma outra natureza. A tendência é de que venha a haver cada vez mais a aproximação frente aos fatos que se desenham como ameaça à vida nacional.
Folha - Darcy Ribeiro diz sonhar com a fusão dos dois partidos. O que o sr. acha da idéia?
Brizola - Não duvido que venha a ocorrer, mas ainda não vejo como. Nossas divergências se tornaram pequenas, mínimas, desprezíveis, frente ao que querem fazer com a nação, aos direitos do povo brasileiro. Verifico que isso encontra grande acolhida por parte do PT, que aplaude com entusiasmo minhas afirmações.
Folha - O sr. chegou a pensar no Lula como condutor do trabalhismo. Ainda acha isso?
Brizola - Tínhamos esperanças numa aproximação maior, até mesmo uma unidade entre nós, mas os fatos não confirmaram nossas expectativas. Agora não deixo de cultivar esperanças de que essa aproximação se dê cada vez mais. O Lula está somando experiências. Quanto ao seu futuro, é um homem jovem, vai depender dele.
Folha - Não é um anacronismo defender os mesmos ideais nacionalistas dos anos 50 com tantas mudanças no mundo?
Brizola - Por que só em relação a nós é anacronismo? Por que não dizem isso a respeito do sr. Roberto Marinho, que tem a Globo há tantos anos, com as mesmas posições? Basta ler os jornais de 40 anos, eram as mesmas posições. O Roberto Campos é o mesmo de 40 anos atrás. Por que as posições dele não são ultrapassadas?
Vivemos uma época de propaganda e massificação da informação. Lutamos contra isso, procurando manter as posições originais, que integram princípios que sofrem adaptações, mas não há porquê mudar na essência. Nos posicionamos pela democracia. Assumimos um compromisso com a liberdade.
Folha - Após a derrota de 94, o que o anima a acreditar que o trabalhismo vai sobreviver?
Brizola - Vivemos um modismo impulsionado pelos sistemas de comunicação, que funcionam no Brasil como partido único. Apoiou o Real assim e está fazendo o mesmo com esse processo aos trancos e barrancos, a insensatez das privatizações no grito.
Permanecemos na resistência. Não nos importamos com alguns resultados eleitorais adversos.
Assistimos muitas situações assim. Quando Hitler estava massacrando os judeus, a classe média vibrava, queria mais, denunciava mais judeus. Quando Hitler dizia `vamos construir uma nova ordem internacional', todo mundo achava que aquilo é que tinha que ser.
Resistimos a isso que querem fazer agora. Se o PT, o PDT e os partidos populares estão errados, quem está certo? O PSDB? Não é um partido. É um clube de intelectuais pretensiosos, de políticos que estão vivendo suas oportunidades. Não tem expressão nenhuma.
Os conservadores estão certos? Qual é a expectativa, a bandeira, a esperança com que acenam para o povo brasileiro? Nenhuma. Para que fazer tudo que eles querem?
Acho que o futuro é nosso, do socialismo. Só com o socialismo a humanidade vai resolver seus problemas. Estive na China e imaginei aquele país sob o capitalismo. Era a própria anarquia, uma monstruosidade. Agora se organizou, através de um regime de dureza.
Eles dizem que tiveram que assumir certa dureza para enfrentar as pressões capitalistas externas. Agora, que aquela camada não existe mais, é toda uma brotação nova, eles vão abrindo, ensejando oportunidade para todos.
Folha - O sr. se apega a algum fato para ter esperança no futuro do trabalhismo?
Brizola - O processo social. Esses esquemas todos que estão colocando em prática não têm futuro. O país está sob a espoliação internacional e, enquanto não cuidarem desse lado, não teremos equilíbrio.
Folha - PT e PDT devem ter candidato único a presidente?
Brizola - Quase que obrigatoriamente. É o mínimo de bom senso político, em face das experiências, das frustrações anteriores.
Folha - Brizola ou Lula?
Brizola - É uma elocubração que não cabe fazer. Estou seguindo o processo social. Meu destino é seguir o processo social. Se Deus lá em cima, que já foi muito generoso comigo, me permitir seguir, vou encerrar minha vida bem. Quero encerrá-la lutando. Isso me faz bem, me dá até saúde.

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