São Paulo, segunda-feira, 22 de maio de 1995 |
Texto Anterior |
Próximo Texto |
Índice
Bailes 'black' adotam o 'bate-cabeças'
MARCEL PLASSE
Os passos são relativamente simples. O corpo se projeta para o alto. Às vezes, em um salto do palco. Outras, a partir de um pulo do meio da platéia. Os movimentos são chamados de ``stage dive" ou ``mosh". Quem não pula, empurra. Agita pernas e braços, conquistando espaço com o corpo. Durante duas décadas, esta coreografia foi associado ao punk rock. Hoje, está sendo praticada nos bailes ``black" de São Paulo. ``Pegou forte", acredita Rubia, 26, rapper do RPW, o principal grupo da cena e um dos raros do rap brasileiro a ter um videoclipe na programação da MTV -a música ``Pule ou Empurre". Foram os rappers que levaram o ``bate-cabeças" para a periferia, confrontando o clima até então pacato dos bailes ``black". Agora, a tradição das danças coreografadas, o ``samba rock", o ``charme" romântico e as trocas de ``chamada e resposta", entre DJ e pista, correm risco de extinção. Os frequentadores dos bailes gostaram de pular. As noites em que grupos de rap ``bate-cabeça" se apresentam são as mais lotadas. ``Nunca teve tanta gente indo aos bailes quanto agora", diz Snoopy, 19, do grupo ``bate-cabeças" Negros Contra o Sistema. ``Quando a gente começou a seguir essa linha, achava que ia ficar num lance alternativo toda a vida", diz Rubia. ``A gente nunca pensou que os bailes fossem assimilar e causar tanta repercussão." O ``bate-cabeças" entrou na periferia há cerca de quatro meses. Mas evoluiu rapidamente, a ponto de já ter redefinido o papel dos rappers nos bailes ``black". A origem da dança -ou movimento, segundo alguns envolvidos- foi uma colisão cultural. Tudo começou há dois anos, no centro de São Paulo, quando grupos de rap passaram a se apresentar para platéias brancas. Na época, as casas da noite ``underground" (como Der Tempel e Urbânia) começavam a misturar rap em sua discotecagem de rock. O público destes lugares era, em sua maioria, skatista. ``Ninguém esperava que o pessoal fosse pular e agitar tanto nos primeiros shows que a gente deu no centro", lembra Camburão, 21, do grupo Pavilhão 9. O Pavilhão 9 foi um dos primeiros grupos de rap a tocar no circuito do rock paulista. Embora não defina seu estilo como ``bate-cabeças", tornou-se, ao lado de Doctor MC's e RPW, um dos precursores da cena. A energia do público de rock, durante os shows, impressionou os rappers que fizeram o ``crossover" (transição). ``Quando a gente tocava nos bailes `black', o público ficava todo parado, prestando atenção nas letras", compara Camburão. Aos poucos, os skatistas começaram a ir à periferia, atrás das bandas. Acabaram contaminando os bailes com sua animação. Há duas versões para o nome: ele teria surgido com o impacto de uma cabeça no chão, após um ``mosh" mal executado, ou seria a tradução literal do termo ``head banging" (bater cabeças é como se chama, nos EUA, o movimento vertical de cabelos dos fãs de heavy metal). A última teoria é reforçada pelo fato de o rapper W-Yo, do RPW, ter começado numa banda de thrash metal. A novidade já dividiu o movimento hip-hop de São Paulo entre ``radicais" e ``bate-cabeças". Racionais é o maior exemplo de grupo ``radical". ``O `bate-cabeças' manda a mesma mensagem dos grupos `radicais' ", explica MCA, do Doctor MC's. ``A gente também procura falar coisas sérias, mas dá o recado com um ritmo dançante. O pessoal não estava preocupado em fazer dançar, achando que quem vai aos bailes sai de casa para ouvir sermão." Dançar, claro, quer dizer pular. Além de trazer batidas mais pesadas, o estilo incorpora elementos de jazz. As influências incluem os grupos de rap americano Cypress Hill, House of Pain, Onyx e Fugees. O Onyx chegou a gravar um hino da dança em 93: a música ``Slam" (nome dado ao estilo agressivo das coreografias punk e heavy metal nos EUA). Apesar do sucesso, ainda há poucas músicas gravadas sobre a dança. As mais populares são ``Pule ou Empurre", do RPW, e ``Energia", do Doctor MC's. Os títulos explicam tudo. Por sua origem em clubes de skate, as letras do ``bate-cabeças" não costumam abordar o racismo. ``Nosso público não é racista", diz MCA, que garante ter muitos fãs brancos. Graças à presença de Rubia no microfone do RPW, o estilo também escapa dos clichês machistas. ``Eu incentivo as mulheres a dar `mosh' também", ela conta. Texto Anterior: Tizuka inicia filmagens de longa no ES Próximo Texto: Voz de Michael está impotente para gritar Índice |
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress. |