São Paulo, domingo, 28 de maio de 1995
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Recessão nos próximos meses tenta `corrigir' crescimento do início do ano

CARLOS ALBERTO SARDENBERG
DA REPORTAGEM LOCAL

O Brasil chegará ao final deste ano com uma produção superior à de 1994. Rigorosamente, portanto, 1995 não será uma ano de recessão, já que a economia não terá tido ao longo dos 12 meses crescimento negativo. Ou seja, em dezembro próximo, o país terá mais mercadorias e serviços de que dispunha em dezembro de 1994.
Mas até lá, haverá uma clara sensação de recessão na sociedade: a cada mês a economia produzirá menos, venderá menos e oferecerá menos empregos.
Para resumir: terminado o ano, o Brasil estará mais rico do que em 1994, isto é, terá um Produto Interno Bruto (PIB) maior. Mas o Natal será bem mais pobre do que o do ano passado -com crescimento no último trimestre podendo até ser negativo.
Essa é a previsão de consultores e, também, o objetivo da política econômica do governo. A economia brasileira está ``aterrissando", como dizem os economistas.
Isso significa reduzir o ritmo de crescimento, que vinha acelerando fortemente desde o Plano Real. No primeiro semestre de 1994, ainda na fase da inflação alta, a economia brasileira estava crescendo na base de 4% ao ano. Portanto, se a economia mantivesse constante seu nível de atividade ao longo de todo o ano, o PIB terminaria 1994 sendo 4% superior ao do ano anterior.
Mas, introduzido o real, em julho, a economia começou a deslanchar. No final do ano, o PIB era 5,7% superior ao de 1993 -o que demonstra que o segundo semestre foi muito aquecido.
Para chegar à média de 5,7% de crescimento, compensando os 4% do primeiro semestre, a atividade econômica foi escalando a cada mês. E continuou assim no começo deste ano.
Comparado o PIB do primeiro trimestre de 1995 com o mesmo período do ano passado, verificou-se que a economia estava crescendo na base de fantásticos 10% ao ano.
As razões principais desse crescimento são conhecidas: ganho salarial com o fim da corrosão inflacionária e o convite ao endividamento pessoal feito pelo ambiente de estabilidade.
O crescimento era esperado, mas sua intensidade assustou o governo e o levou a tomar um conjunto de medidas anticonsumo -basicamente, taxas de juros altas e retirada de dinheiro de circulação, de modo a travar os negócios a crédito.
Nesse quadro, duas questões vêm sendo debatidas por empresários, políticos, economistas e consultores. Primeira: por que o país não pode crescer 10% ao ano? E, segunda: qual será a força da desaceleração?
``A economia estava explodindo. Sem congelamento, isso iria virar inflação cedo ou tarde", diz o presidente do Banco Central, Pérsio Arida.
Viraria inflação porque a indústria não seria capaz de atender o mercado. No início do real, a indústria brasileira estava utilizando 75% de sua capacidade instalada.
Com o real, foi aumentando a utilização das máquinas até chegar perto do máximo possível. Dali em diante, só conseguiria aumentar a produção com novas fábricas, o que leva tempo para construir.
A importação complementa a produção local e foi largamente utilizada desde o início do plano. Mas também chegou a um limite, porque o governo, depois da crise do México, se viu na necessidade de gerar superávits no comércio externo.
Precisando exportar mais e importar menos, a economia não poderia atender a disposição de compra dos consumidores. Com mais consumidores do que produtos disponíveis, os preços sobem.
Uma alternativa seria reduzir o poder de compra dos consumidores aumentando, por exemplo, o imposto de renda -como sugeriram alguns economistas. Seria correto do ponto de vista técnico, mas obviamente inviável do ponto de vista político.
Como a atual equipe econômica sempre recusa o congelamento de preços, o governo optou pela restrição ao consumo através da política monetária.
``Não se pode brincar com consumo aquecido. O brasileiro fez o dever de casa que qualquer outro faria", diz Pérsio Arida.
A política está funcionando: são visíveis os sinais de desaquecimento, ou seja, queda de vendas de um mês em relação ao anterior e diminuição do número de empregados na indústria. E a inflação está caindo em maio, segundo apontam todos os índices.
Mas há divergências quanto ao grau do desaquecimento. Arida diz que a economia vai levar um ``tranco", mas não traduz isso em números. Garante, entretanto, como todos os membros da equipe, que não haverá recessão.
É uma garantia que só vale para a conta de ano para ano. Na observação mês a mês, é certo, tudo cairá: vendas, empregos e preços.
Para a MCM Consultores, empresa do ex-ministro Mailson da Nóbrega, o segundo trimestre já vai mostrar um ritmo de crescimento de 8%, contra os 10% do primeiro. E o declínio levará a 5,8% de crescimento do PIB no final do ano.
Claro que 5,8% é uma média. O que quer dizer que, para compensar os 10% do início do ano, o último trimestre de 95, comparado com o mesmo período de 1994, terá crescimento zero ou até mesmo negativo.
Essa situação indicaria uma recessão parcial -não exatamente uma catástrofe, como imaginam alguns.
Para Mailson, o país vai seguir assim: sem recessão, mas devagar, ao longo deste e do próximo ano.
Michael Gartenkraut, da Rosenberg Consultores, acredita que o ``tranco" neste momento será muito forte. Ele acha que o governo exagerou na dose e que a ``paradeira" será maior do que se espera. Ou seja, a recessão nos próximos meses será mais profunda.
Gartenkraut aposta num crescimento de apenas 4% na média do ano, quase dois pontos abaixo da previsão da MCM.
Mas as duas consultorias, como a maioria dos economistas, convergem quanto à tendência: desaceleração forte agora e manutenção de um ritmo morno em 1996, com crescimento na faixa dos 3% -pequeno quando se sabe que a população cresce 1,8% ao ano.

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