São Paulo, quarta-feira, 31 de maio de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Um novo modelo de desenvolvimento

MÁRCIO FORTES

Os recentes eventos de comemoração do término da Segunda Guerra Mundial também trazem à memória a evolução do desenvolvimento nacional -político e econômico- nestes últimos 50 anos.
Tratava-se, naquele momento, de dotar o país de instrumentos para acumular recursos financeiros e tecnológicos e capacitá-lo com recursos humanos para aproveitar as riquezas minerais, dominar processos industriais, conhecer, estabelecer, aumentar e melhorar a infra-estrutura de forma autônoma e independente de interesses não-brasileiros.
A partir da concepção e criação da Companhia Siderúrgica Nacional, em Volta Redonda (RJ), o modelo de desenvolvimento implantado, a partir da primeira metade da década de 50, criou a Eletrobrás, a Petrobrás e o BNDE -hoje BNDES.
A luta e as discussões políticas pela instituição do monopólio do petróleo e a criação da Petrobrás, traduzidas na lei 2.004, datam dessa época. Alguns imaginaram, por exemplo, que a Amazônia era um mar de petróleo a pequena profundidade e que tal instituição propiciaria a rápida auto-suficiência do país em petróleo e seus derivados.
Assim, o BNDE inicialmente financiou a melhoria e a expansão de sistemas de transporte, energia e comunicações, em sua maior parte recentemente nacionalizados e estatizados. Estratégia adequada a seu tempo, politicamente amparada e que propiciou condições para a rápida industrialização do governo JK, já prevista nos planos da Comissão Mista Brasil-Estados Unidos, constituída no pós-guerra.
O BNDE, na década de 60, estimulou as chamadas ``indústrias de base" e, nos anos 70, depois do segundo Plano Nacional de Desenvolvimento, operou com sucesso a política de substituição de importações, fazendo com que, ao fim daquela década, quase nada deixasse de ser fabricado no Brasil. Em seu tempo, a estratégia certa, a partir de uma oferta de recursos externos decorrente da reciclagem dos petrodólares e da política mundial de fechamento das nações em si próprias.
Para nós, brasileiros, os anos 80 foram um interregno. Perplexidade política, surpresas, tomada de consciência da própria realidade, início de adaptação a uma nova conjuntura internacional. A passagem do regime autoritário para a democracia foi marcada pela reorganização partidária; pela campanha das diretas-já; pelo falecimento do presidente Tancredo Neves; e pela elaboração da nova Constituição.
Do ponto de vista econômico, deparamo-nos com o novo perfil do sistema financeiro internacional, que passou a tornar indisponíveis os créditos para o setor público. Ao mesmo tempo, em várias partes do mundo surgiu a novidade de o setor privado assumir parcelas de responsabilidade por atividades antes restritas ao setor público. A América Latina vivia a sua inadimplência, a partir da falência do México, em 1982.
Na década de 1990, o desenvolvimento foi redefinido. País desenvolvido não é mais aquele que apresente apenas notáveis indicadores de oferta de infra-estrutura, nem mesmo de renda per capita e de distribuição estatística de renda.
Desenvolvido, hoje, é o país que apresente menor mortalidade infantil, maior expectativa de vida, maior número de anos de escolaridade para os já alfabetizados, maior utilização do conhecimento adquirido por seus cidadãos -para citar apenas alguns dos indicadores hoje adotados. Podemos mencionar, ainda, os temas ligados ao crescimento da população, à concentração nas megacidades, às questões ambientais e à adequação dos mercados de trabalho como exemplos que merecem a atenção para a definição do desenvolvimento.
O que o governo faz hoje, ao mesmo tempo em que procura, com absoluto respeito à lei, otimizar o uso dos recursos nacionais para manter o país funcionando sem aumento da taxa inflacionária, é propor reformas e instrumentos legislativos para a efetiva retomada do desenvolvimento, dentro dos novos conceitos e definições.
As reformas políticas, da administração pública, dos sistemas tributário e previdenciário são necessárias e serão propostas e aprovadas com tal motivação, como foram aquelas promovidas em outros momentos da nossa história.
É nesse contexto que se insere a necessidade de redefinição do papel do Estado e da privatização, atribuindo à iniciativa privada maior responsabilidade na prestação de serviços públicos e na competência de prover infra-estrutura e produção industrial, hoje ainda a cargo exclusivamente de governos.
O maior conhecimento e a rápida aplicação da nova Lei de Concessões, a modelagem, avaliação e alienação do controle de grandes empresas estatais e a sanção e aplicação das leis que tornem realidade a flexibilização dos monopólios atrairão, desde logo, capitais de risco, cooperação e desenvolvimento tecnológico, criarão empregos e qualificarão melhor os postos de trabalho, para que os cerca de 200 milhões de brasileiros do ano 2010 encontrem uma nação mais justa e que ofereça oportunidades dentro dos novos conceitos de desenvolvimento.
Nesse quadro, o poder público, liberado de obrigações que hoje o asfixiam, fará sua parte como supridor de meios; esgotará, com tranquilidade, sua capacidade de endividamento para os investimentos no suporte social; e exercerá seu poder político para regular e fiscalizar as funções públicas outorgadas ou concedidas ao setor privado.
Os monopólios da União em petróleo e telecomunicações serão, assim, exercidos por um sem-número de empresas, além das estatais que não forem privatizadas. Estas encontrarão novos caminhos para seu próprio desenvolvimento, num ambiente competitivo que só lhes será estimulante e benéfico.
São exemplos de estímulo às modificações no monopólio a Vale do Rio Doce, estatal permanentemente exposta à competição internacional, e todo o setor siderúrgico, recentemente privatizado, com seus magníficos indicadores de melhoria da contribuição ao país, às regiões em que operam, aos setores em que atuam e aos seus recursos humanos.

Texto Anterior: Em prospecção; Muy simple; Linha aberta; Caminhos do México; Depois da aceleração; Lição brasileira; Argumento britânico; Renda cambial; Dupla perda
Próximo Texto: Veja como calcular lucro na venda de imóvel
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.