São Paulo, quarta-feira, 31 de maio de 1995
Texto Anterior | Índice

Coreógrafo israelense procura as `qualidades animais' dos bailarinos

ANA FRANCISCA PONZIO
ESPECIAL PARA A FOLHA

O coreógrafo israelense Ohad Naharin, 42, inaugurou uma nova era para a Batsheva Dance Company, que se apresenta em junho no Carlton Dance Festival.
Patrocinado pelo milionário Bethsabee Rothsehild (cujo nome em hebreu é Batsheva), o grupo foi formado em 1964 por Martha Graham, que atuou como conselheira artística nos primeiros anos.
Mais tarde, a companhia distanciou-se dos conceitos de Graham, somando a seu repertório obras de coreógrafos como Kurt Joos, Paul Taylor, Jerome Robbins. Atravessou fases de pouca expressão, até tornar-se o principal grupo de dança de Israel.
Com Naharin, o Batsheva ganhou brilho próprio. Autor de obras contundentes, ele faz da técnica clássica um instrumento vivo, ao qual soma temas singulares e todas as possibilidades de movimentos da época contemporânea.
``Gosto de conectar os corpos dos bailarinos com qualidades animais. Quando olhamos um animal, notamos quão eficientes e incríveis são seus movimentos. No elenco, todos são virtuosos, mas não é possível reconhecer escolas", disse Naharin em entrevista à Folha.
Em outubro de 1994, a coreografia ``Perpetuum", de Naharin, foi o ponto forte dos espetáculos apresentados no Brasil pelo Ballet du Grand Théâtre de Genéve.
Tudo indica que Naharin vai repetir o sucesso com ``Mabul", a peça escolhida para o Carlton Dance. ``Mabul, em hebreu, significa dilúvio, no sentido bíblico", comenta Naharin, que não gosta de falar sobre seus espetáculos.
``Na coreografia, o sentido de dilúvio é usado para descrever qualquer tipo de situação, pode ser um dilúvio de culpas ou de acontecimentos. O significado fica por conta da imaginação do público."

Rato
Naharin quer que os espectadores assistam a seus espetáculos com a ``mente limpa". Por isso, prefere não entrar em detalhes sobre o rato incluído em ``Mabul", que caminha sobre o corpo e a cabeça raspada de um bailarino. ``Minha intenção não é surpreender", adianta apenas.
``Em `Mabul' há uma fusão entre dança e música. É como o encontro de dois elementos, que criam um novo elemento. As escolhas musicais foram extremas, há de Vivaldi a John Zorn."
Apesar da importância de Martha Graham na carreira de Naharin, ele diz que a coreógrafa norte-americana não lhe serve de fonte de inspiração.
``Aprendi muito com ela. Martha me levou para os Estados Unidos, me ajudou a chegar a Nova York. Mas, em termos de criação, ela não faz parte de minha fantasia", afirma.
Como artista judeu, Naharin não pretende representar as inquietações de sua cultura ou país. ``Quando estou criando, sou apenas uma pessoa. Não tento transmitir minha história para o público, mas conectar o público com sua própria história."

Corpos
Para Naharin, o principal tema de ``Mabul" são os corpos humanos. ``Na essência, mostra o que o corpo pode fazer, além de se mover de forma bonita."
Para os críticos, uma força vital emana da coreografia, que se compõe de imagens fragmentadas, plenas de lirismo e violência, às vezes remetendo à Idade Média.
``Não acredito em dança abstrata", acrescenta Naharin. ``Abstração, para mim, é um termo semântico. Não consigo olhar para as pessoas e não ver nada."

Texto Anterior: Lobão assina contrato com a Virgin e senta no ``banquinho" da MPB
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.