São Paulo, segunda-feira, 5 de junho de 1995
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Caça-fantasmas. The end

WASHINGTON OLIVETTO

Esse tipo de pseudo- propaganda prejudica e desmoraliza o negócio da propaganda
Esta é a última vez que eu escrevo sobre a propaganda fantasma.
Prometo abandonar a teoria e ir direto à prática.
O problema da propaganda fantasma não está no fato de que fazendo esse tipo de propaganda facilzinha, genérica e nunca veiculada, alguns publicitários ganhem mais medalhinhas nas premiações do que outros que trabalham a sério com a preocupação de resolver os problemas mercadológicos dos seus clientes.
Esse pedaço das medalhinhas soa até um pouco colegial e se o problema se restringisse a isso não valeria a perda do meu tempo e muito menos do seu.
O relevante dessa questão é que esse tipo de pseudopropaganda prejudica e desmoraliza o negócio da propaganda.
Posiciona os profissionais de criação, que tanto lutaram para serem respeitados aos olhos dos anunciantes, como um bando de porras-loucas que trabalham em função da turminha deles.
Confere status a medíocres e desacredita talentos verdadeiros que, ingenuamente, acabam caindo nessa armadilha só para seguir a onda.
Gera um descritério nos profissionais iniciantes, que passam a imaginar que bacana mesmo é criar propaganda sem cliente, sem veículo e sem consumidor.
Cria uma documentação errônea e, portanto, uma memória falsa da profissão.
Faz com que idéias tidas aleatoriamente sejam registradas como existentes e algumas delas, até interessantes, nunca mais poderão ser utilizadas numa campanha de verdade.
Dá aos patrões da propaganda a sensação de que pagar altos salários é mau negócio já que, qualquer idéia amadorística, típica de um estudante em busca de estágio, é reconhecida pelos próprios profissionais como um grande gesto criativo.
Faz com que gente séria pague para gente irresponsável brincar.
Sendo um pouquinho mais claro. Quem você acha, por exemplo, que paga as produções dos filmes fantasmas? As agências? As produtoras? Os criadores? Não, meu amigo. Quem paga é o ``overprize" embutido no orçamento dos filmes existentes.
A coisa é realmente escandalosa; merecia quase que uma CPI, mas acho que alguns gestos práticos já ajudam bastante.
Um que a gente adotou na W/Brasil é evitar contratar ou trabalhar com quem faz esse tipo de coisa. Lógico: quem está contra o negócio da propaganda está contra a gente.
Outro gesto foi a publicação do gibizão Mata a Cobra e Mostra o Pau, da W/Brasil, que está sendo distribuído para o nosso mailing e vendido nas bancas de São Paulo e Rio.
O último gesto é uma sugestão para esta Folha de S. Paulo.
Que tal aproveitar o próximo Festival de Cannes, pegar as peças inscritas e levantar as aprovações junto aos clientes?
Tenho certeza de que alguns deles sequer sabem que seus santos nomes estão sendo usados em vão.
Quando sugiro que se questione a aprovação é porque ela é quem realmente documenta a existência da publicidade.
Às vezes até mais do que a veiculação, que pode ser feita uma vezinha de madrugada (até o horário é fantasma) só para fingir que a campanha existe.
De posse dessas informações a Folha pode, inclusive, criar o prêmio Fantasma de Ouro, Prata e Bronze para as agências e produtoras mais fantasmagóricas.
Tenho certeza de que esse gesto ajudaria a resolver o problema e agradaria a todos: os profissionais sérios, que estão preocupados com o assunto, os anunciantes, que teriam uma melhor oportunidade de conhecer quem é quem e a turma dos gasparzinhos, que teria a oportunidade de acrescentar mais algumas medalhinhas na sua galeria de troféus falsos.

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