São Paulo, terça-feira, 6 de junho de 1995
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Semeando tempestades

Não existe infelizmente no Brasil o hábito extremamente saudável de cobrar das autoridades das mais diversas esferas de poder que respondam pelas políticas equivocadas, para dizer o menos, que muitas vezes adotam em suas gestões.
A notícia de que a Prefeitura de São Paulo aumentou seu endividamento em 72% durante a administração de Paulo Salim Maluf é no mínimo inquietante.
O estoque da dívida paulistana -R$ 3,1 bilhões- representa 75,6% da previsão de arrecadação total da prefeitura este ano -R$ 4,1 bilhões-, segundo dados da própria Câmara Municipal.
É evidente que prefeituras, Estados e a União -bem como qualquer empresa ou cidadão- podem recorrer ao endividamento para financiar suas necessidades. É preciso, porém, que a capacidade de pagamento esteja assegurada.
É frequente, contudo, observar mandatários que se preocupam apenas com a sua gestão e suas necessidades eleitoreiras -descartadas outras hipóteses-, sem ligar para a bomba-relógio que podem estar armando para seu sucessor. Ao contrário do que ocorre com o cidadão comum ou empresa que tomam crédito, os mandatários não respondem pelo endividamento irresponsável que só vai estourar nas mãos do seu sucessor.
Mesmo que a Prefeitura de São Paulo tenha saúde financeira para honrar seus compromissos -o que ainda está por ser provado-, é de se indagar se é mesmo o caso de contrair empréstimos em tal magnitude. Como se sabe, os elevadíssimos níveis de juros fazem com que os estoques da dívida cresçam em progressão absurda. Assim, o valor futuro da dívida contraída hoje pode acabar se revelando muito maior do que o benefício que ela agora eventualmente proporcione.
A irresponsável mentalidade do ``après moi le déluge" de muitas das autoridades brasileiras que costuma jactar-se das obras que autorizaram é uma das principais fontes de atraso do país. Na verdade, o que esses maus políticos fazem é ludibriar a população enquanto semeiam tempestades.

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