São Paulo, quinta-feira, 8 de junho de 1995
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Theroux troca aventura pelo turismo na China

MARCELO REZENDE
DA REPORTAGEM LOCAL

Em 1988 o escritor norte-americano Paul Theroux realizou uma viagem pela China, de trem, onde descobriu um lugar que se preparava para se ajustar às ondas de capitalismo que avançavam, naquele tempo.
O que Theroux viu e experimentou, o leitor brasileiro poderá descobrir agora, sete anos depois, com a publicação de ``Viajando de Trem Através da China", que a editora L&PM acaba de lançar no Brasil.
Theroux é conhecido como um dos mestres do ``travel-writing", a chamada literatura de viagens. Ao lado do britânico Bruce Chatwin (outro habilidoso escritor do gênero, já morto), fez com que o mundo conhecesse melhor lugares como a Patagônia, na Argentina, a África ou a Índia.
Mas ele é também um romancista. Seu mais famoso trabalho de ficção, ``A Costa do Mosquito", acabou adaptado para o cinema pelas mãos do diretor australiano Peter Weir.
No filme, estrelado por Harrison Ford, um homem renega a civilização e acaba arrastando sua família para uma ilha nos trópicos, em busca de uma certa pureza, só possível de ser resgatada na natureza. Ou melhor, no puro estado selvagem.
Dessa vez, Theroux viaja por Pequim, Xangai, Cantão e outras províncias chinesas, sempre colocando em primeiro plano não exatamente a China que vê, mas quase exclusivamente o que pensa sobre o mundo, os monges no Tibete ou os personagens agradáveis ou repulsivos que encontra pelas ferrovias chinesas.
Por meio de sua narrativa, Theroux é capaz de pequenas condenações sobre os lugares que entende tão pouco, como no início do livro, quando apresenta a China do passado: ``Eu havia visto a China no inverno de 1980. Ela parecia triste e exausta, toda composta de roupas azuis e folgadas e lemas não convincentes em bandeiras vermelhas".
Quase como um romance juvenil, ``Viajando de Trem Através da China" serve, talvez, não para conhecer ou mergulhar em um país ou em sua cultura. Mas para despertar no leitor um extremo -e saudável- desejo de partir, de fortalecer a aventura pelo lugar estranho. Sua falha é, então, anular o mistério de um país e colocar em seu lugar seu próprio passado e crenças.
Talvez menos por culpa de Theroux, e mais pelo que representa uma literatura de viajantes na era contemporânea, bem longe da tradição do século 19, pródiga em autores que fizeram da viagem, uma maneira de tocar o que havia de maravilhoso em um lugar distante.
Se um autor como o megaviajante inglês Richard Burton explorava as costas brasileiras e o Oriente em busca da ciência e da aventura, em Theroux esse mesmo desejo não existe mais.
Ele também não faz como o escritor polonês Joseph Conrad, que atravessou os mares durante o século passado, para produzir uma refinada literatura.
O viajante de hoje não consegue escapar do fato de que o mundo de aventuras se reduz apenas ao que hoje se denomina turismo. Ou seja, uma forma sofisticada de divertimento, e não mais de descobertas -ao menos não literárias.
E assim é seu livro, uma forma de divertimento que consiste em fazer com que o leitor acompanhe o espanto do autor pelos caminhos exóticos da China, inferior a ``The Great Railway Bazaar", outra de suas passagens pela Ásia.
Para quem deseja viajar pela China através de livros, qualquer relato do italiano Marco Polo ainda é bem melhor.

Livro: Viajando de Trem Através da China
Autor: Paul Theroux
Tradutor: Magda Lopes
Preço: R$ 32

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