São Paulo, sexta-feira, 16 de junho de 1995
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Spike Lee produz novo 'Hoop Dreams'

AMIR LABAKI
ENVIADO ESPECIAL AO RIO

O cineasta americano Steve James encerra hoje sua meteórica primeira visita ao país. Veio ao Rio como convidado do evento ``A Construção do Futuro - Mais Um Século de Cinema", realizado no Centro Cultural Banco do Brasil. O tema de sua palestra ontem foi o impacto sobre a produção de documentários nos EUA de seu longa de estréia, ``Hoop Dreams".
``Hoop Dreams" é um fenômeno. Durante cinco anos (1986- 1991), James acompanhou dois jovens negros de origem humilde em Chicago. William Gate e Arthur Agee tinham um sonho comum: tornarem-se astros da NBA, a milionária liga profissional americana de basquete.
Eleito melhor filme pelo público do Sundance Film Festival em 1994, ``Hoop Dreams" não pára de colecionar prêmios. Exceto um: sua não-indicação ao Oscar causou furor nos EUA e estabeleceu sua reputação como um das mais cultuadas produções independentes dos anos 90. O filme tem distribuição comercial em cinema e vídeo no Brasil já garantida.
Steve James falou à Folha sobre o desenvolvimento e a repercussão de seu filme, explicou a história de uma possível refilmagem e adiantou seus novos projetos.

Folha - Como ``Hoop Dreams" evoluiu de um projeto de curta para um longa de três horas rodado em cinco anos?
Steve James - A decisão veio muito cedo, quando saímos para as primeiras pesquisas e descobrimos Arthur Agee. Acompanhamos o caçador de talentos Earl Smith em ação em vários playgrounds de Chicago. A idéia original para o curta era focalizar um único playground, acompanhar as crianças que jogam lá, um cara que começou lá e entrou para o sistema, um profissional que saiu de lá.
Comecemos a seguir a história de Arthur, o vimos viajando diariamente de madrugada de trem de uma comunidade pobre de Chicago para uma escola como Saint Joseph. Encontramos lá William Gate. Achamos logo que seria mais interessante segui-los por algum tempo do que apenas ficarmos lá para fazer um curta os acompanhando por algumas semanas.
Folha - O senhor rodou 250 horas para ``Hoop Dreams". Quantas em vídeo e quantas em filme?
James - Na verdade, o filme inteiro foi rodado em vídeo e depois transferido para filme. É um testemunho do desenvolvimento dessa tecnologia. O vídeo tornou possível começar um projeto de documentário com praticamente nenhum dinheiro. É muito mais portátil. Muito do filme foi rodado por mim e por Peter Gilbert, co-produtor e câmera do filme. Ganhávamos assim mais momentos de intimidade com as pessoas.
Folha - ``Hoop Dreams" tem um desenvolvimento dramático impressionante. Muitas cenas foram ficcionalizadas, isto é, reencenadas para a câmera?
James - Ocasionalmente, sim. Há uma cena com uma orientadora educacional que dá uma ``dura" em Arthur. Em entrevista sete semanas antes da filmagem, ela nos dissera que iria pôr as coisas a limpo. Pedimos para filmar o encontro e ela autorizou.
Quando rodamos, ela agiu de forma bem diferente, conversando calmamente. Ao fim da cena, eu disse a ela: ``É isso que você queria dizer?" E rodamos de novo.
Folha - A polêmica em torna da não-indicacão do filme para o Oscar não acabou sendo até melhor que o próprio prêmio?
James - Concordo. Acho até que em alguns anos as pessoas vão achar que ganhamos (risos). A polêmica ajudou muito nas bilheterias. Ganhamos tantos prêmios que, acredite, não ligo por não ter sido indicado.
Folha - É verdade que Spike Lee, que aparece rapidamente no filme, pretende fazer uma refilmagem ficcional?
James - Não sei o que vai acontecer, mas Spike assinou para ser o produtor executivo de uma nova versão. Eu estou ligado ao projeto como produtor. Não serei o diretor e provavelmente tampouco Spike.
Folha - Em que pé está seu novo projeto, ``The New Americans"?
James - Fiz um texto de apresentação. É um projeto monstruoso. A idéia é começar com pessoas em seus países de origem, descobrir como são suas vidas, entender por que se mudam para os EUA e o que encontram aqui de verdade, seguindo-os por alguns anos.
Folha - Para terminar: William e Arthur chegaram a jogar na NBA?
James - William está terminando a universidade e pretende organizar a fundação Hoop Dreams para ajudar os estudos de crianças. Ele recebeu uma série de propostas de trabalho, até da Nike, e pode se tornar comentarista de TV em Chicago. Arthur está jogando numa liga semiprofissional que serve como teste para jogar na NBA. Um time da NBA até já lhe prometeu uma chance.

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