São Paulo, sábado, 17 de junho de 1995
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Tráfico de influência move planeta fashion

BARBARA RUDOLPH
DA REVISTA ``TIME"

A dança se inicia a cada nova temporada. Editores de revistas norte-americanas, poderosos formadores de opinião, de gosto impecável, examinam as araras com peças da nova coleção do estilista. Eles fazem suas escolhas.
Eis que um paletó chama a atenção de uma editora. Ela o experimenta. ``Se você gosta, podemos te mandar um igual", diz o estilista.
Uma ex-editora de moda recorda com saudades seu escritório durante a temporada de Natal. ``A gente recebia coisas lindas", diz ela. ``Um caminhão teve que vir duas vezes à minha casa para dar conta de toda a entrega". Essa senhora estima que em um mês, ela faturou cerca de 200 presentes. Preço no varejo: US$ 25 mil.
``É muito importante para os estilistas que os editores vistam suas roupas", explica a consultora de vendas a varejo Vicky Ross.
Mas existe o outro lado da moeda também: os editores precisam manter os estilistas felizes -o que eles fazem, escrevendo sobre seus trabalhos. Em meses mais prósperos, os estilistas retribuem, anunciando.
Sempre existiu uma intimidade entre poderosos editores e seus poderosos estilistas favoritos: a lendária editora da ``Vogue", Diana Vreeland, Givenchy e Halston, foram precursores.
Mas a recessão nas revistas norte-americanas no início dos anos 90, intensificou a briga por anunciantes e tornou ainda mais conveniente as relações de conveniência. As grandes confecções tornaram-se ainda mais poderosas em função da compra de espaço publicitário.
Além disso, nova formas sutis de tráfico de influência tornaram-se normas de operação nos Estados Unidos. Por exemplo, um diretor de arte de uma revista e também proprietário de um estúdio de design que ajuda a criar campanhas publicitárias para os anunciantes de sua revista.
Alguns editores de moda também atuam como produtores de moda free-lance para os estilistas cujos desfiles devem cobrir como jornalistas, ganhando até US$ 3.000 por dia de trabalho.
``As coisas estão trocadas," diz Holly Brubach, produtora de moda da ``New York Times Magazine". ``Ao invés das amizades serem mantidas fora do trabalho, elas entraram no campo profissional. Você pode vê-las nas revistas".
Outros editores negam a importância dos fatos. ``Eu conheço Calvin Klein desde 1979," diz a editora-chefe da ``Harper's Bazaar", Elizabeth Tilberis. ``Eu conheço Karl Lagerfeld desde 1968. Conheço Gianni Versace desde 1974. Você cresce com essas pessoas e elas sempre serão suas amigas. Mas isso não afeta absolutamente minha opinião ou a compra do espaço publicitário".
E, afinal de contas, para quem não paga por suas roupas, o que significa ganhar um modelo Chanel? ``Eu tenho uma cota bastante generosa para roupas," diz a editora-chefe da ``Vogue", Anna Wintour. ``Mas se um estilista me dá algo, eu não tenho o menor problema com isso. É uma questão de bom senso. Isso não vai influenciar no que você coloca nas páginas de sua revista. Estão fazendo uma tempestade em copo d'água".
É verdade que muitos benefícios vêm com a profissão. Poucas pessoas que trabalham na imprensa, incluindo a revista ``Time", podem dizer que nunca foram convidados para uma projeção de filmes, receberam de graça um livro ou um CD sobre o qual não tinham a menor intenção de escrever. A diferença está na maneira como a imprensa de moda institucionalizou o hábito de receber presentes valiosos, muitas vezes em detrimento de regras explícitas de seus empregadores.
``Quando vou aos desfiles em Paris e Milão o número de sacolas de compras chegando em meu escritório é inacreditável," observa Brubach, que diz não aceitar roupas de graça ou com desconto, observando as normas do ``Times".
A ``Harper's Bazaar" não tem regra explícita determinando se seus funcionários podem ou não aceitar roupas de graça. Condé Nast, que publica a ``Vogue", ``Mademoiselle", ``GQ", proíbe que seus funcionários recebam presentes ``caros", mas o montante não é especificado.
Por serem vagas, tais normas são facilmente contornadas por funcionários mais jovens que não recebem cotas para comprar roupas. ``Você sempre pode pegar emprestado," explica uma pessoa ligada à área de publicações. Às vezes o empréstimo é para sempre. Os fabricantes enviam pilhas de roupas para as fotos das revistas. As sacolas voltam muitas vezes mais leves.
Isso são as miudezas. Cada vez mais, são fechados grandes negócios. Ed Filipowski, um dos diretores administrativos da Keeble, Cavaco & Duka, uma das mais importantes assessorias de imprensa na área de moda em Nova York, diz que ``não são muito claras as fronteiras que separam a publicidade dos editoriais."
``Primeiro você reclama para o editor," explica um assessor de imprensa. ``Como último recurso, você apela para o departamento comercial. Você diz -eu só quero que você saiba que o nosso cliente não tem recebido a cobertura que deveria receber. Achamos que você deve saber disso antes que algo aconteça."
Na ``Harper's Bazaar", o diretor de criação, Fabien Baron, é também proprietário da Baron & Baron, um estúdio de design com clientes como Calvin Klein e Hugo Boss. Embora seja influente na Bazaar, Baron é tecnicamente um free-lancer. Isso o permite aceitar trabalhos fora da publicação.
Importantes editores de moda as vezes trabalham como produtores de moda em desfiles ou campanhas publicitárias. Paga-se entre US$ 2.500 e US$ 3.000.
Nada disso significa que estilistas como Karl Lagerfeld e Donna Karan não tenham merecidamente transformado a maneira como os americanos se vestem. Muitos estilistas são tomados de amores pelos editores simplesmente porque a qualidade de suas peças se sobressai. Mas muitos novos estilistas lutam para terem seus trabalhos vistos por editores de moda que estão começando. ``Você os leva para almoçar. Você liga para eles até que eles aceitem o convite," diz Rachel Danes, de uma confecção de elegantes vestidos de noite. ``O pessoal que faz RP nos diz que temos que mandar roupas de graça. Mas eles não estão pagando."

Tradução: Suzy Capó

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