São Paulo, sábado, 17 de junho de 1995
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Uma medida emergencial

CARLOS GERALDO LANGONI

Qualquer restrição quantitativa ao comércio internacional gera elevados custos alocativos e de bem-estar. No caso específico de cotas, os consumidores perdem por terem limitado o seu universo de escolha e serem forçados a pagar um preço mais elevado pelos produtos. Sob o ponto de vista de produção doméstica, reduz-se o estímulo para ganhos de produtividade e melhoria de qualidade.
A forma mais eficiente para corrigir desequilíbrios na balança comercial é combinar contenção da demanda agregada via ajuste fiscal, com elevação temporária de tarifas e realinhamento da taxa de câmbio. Atua-se simultaneamente tanto sobre a demanda de produtos importados como sobre a oferta de exportações. A expansão sustentada das exportações, num ritmo expressivo, é a única forma de evitar a repetição de crises cambiais quando a economia voltar a crescer em todo o seu potencial.
No caso brasileiro, porém, essa combinação ótima de políticas não pode ser adotada, principalmente pela decisão estratégica (equivocada, no meu ponto de vista) de não incluir, logo de início, a reforma fiscal no contexto das mudanças constitucionais. Sem o instrumento fiscal, o governo fica na dependência exclusiva da contenção do consumo privado pela via monetária, cujo alcance é claramente limitado. A preocupação em manter a inflação sob controle reduz o espaço para desvalorizações mais expressivas, que deveriam ter acontecido logo ao deflagrar da crise mexicana.
Nesse contexto, restam poucas alternativas. O objetivo crucial no momento é impedir perdas adicionais de reservas internacionais que já atingiram seu limite crítico. No presente ritmo, é grande a possibilidade de a balança comercial apresentar saldo negativo em torno de US$ 5 bilhões.
Isso, somado à conta de serviços representaria um déficit em conta corrente de cerca de US$ 20 bilhões, ou 4% do PIB, é impossível de ser financiado nas condições atuais do mercado internacional.
Nesse cenário, as reservas cairiam abaixo de US$ 20 bilhões, equivalente a apenas seis meses de importações, amplificando o risco de crise cambial, cujo impacto recessivo é devastador, como bem ilustra a situação mexicana.
É essa a única e poderosa justificativa para a adoção de cotas de importação sobre automóveis, justamente um dos itens de crescimento explosivo a partir do Plano Real.
Uma última observação: a adoção de cotas não evita a necessidade de novas desvalorizações cambiais, essenciais para romper a estagnação das exportações de manufaturados. O governo ganha, porém, tempo precioso para implementar a medida somente após a desindexação da economia e com perspectivas concretas de um novo regime fiscal.
Em resumo, cotas de importação, no contexto atual de integração e abertura, devem ser entendidas como medida emergencial e necessariamente transitória. Precisam ser eliminadas tão logo o Plano Real reencontre a harmonia macroeconômica. É essencial exorcizar de vez os fantasmas neoprotecionistas que continuam a nos assombrar com o pesadelo das reservas de mercado.

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