São Paulo, domingo, 18 de junho de 1995
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Caro Jaspers

DA REDAÇÃO

Simultaneamente ao lançamento da correspondência entre Hannah Arendt e Mary McCarthy, a Relume Dumará vai publicar um volume com parte das cartas trocadas entre a filósofa e um de seus mestres, Karl Jaspers.
Karl Jaspers (1883-1969), autor de ``Razão e Existência", é considerado um dos maiores representantes do pensamento existencialista na Alemanha. Junto com Martin Heidegger, formou a dupla de principais seguidores da fenomenologia, escola filosófica fundada por Edmund Husserl.
Nos anos 10, Jaspers, formado em medicina, começa a se interessar por filosofia e introduz os métodos da fenomenologia -que pretendia decifrar os processos pelos quais a consciência compreende o mundo como conjunto de fenômenos- em seu objeto de estudo no período, a psiquiatria clínica.
Durante os anos 20, Jaspers abandona a medicina para lecionar filosofia na Universidade de Heidelberg. Foi nessa condição que travou relações com a então estudante Hannah Arendt, a quem orientou na tese de doutorado.
O início da correspondência começa sob o impulso e a curiosidade de Arendt em 15 de julho de 1926. Durante um seminário, Jaspers propôs que os alunos lhe dirigissem questões por escrito, oportunidade que a aluna aproveitou, imediatamente indagando seu professor a respeito da interpretação filosófica da história.
À mesma época, Arendt trava relações com Heidegger, de quem se torna amante. Durante o período que segue, a correspondência é esparsa, mas contínua, até 1933, quando cessa subitamente.
A ascensão do Partido Nacional-socialista de Hitler e a instauração do nazismo na Alemanha separa-os por motivos semelhantes: Arendt, por ser judia; Jaspers, por ser casado com uma. A aluna parte para o exílio, primeiro em Paris, depois nos EUA; o professor inicia sua etapa de "exílio interior".
Em 1933, Jaspers foi exonerado do cargo de conselheiro da universidade, mas até 1937 lhe é permitido lecionar e publicar. Em 1937, o regime nazista proíbe-lhe o exercício de qualquer atividade pública. Sob a sombra de Hitler, as cartas quase se extinguem: duas de Hannah em 1936, uma de Jaspers em 1938, e nada mais.
Só com o fim da guerra, em 1945, o contato se restabelece e se aprofunda, com o deslocamento de Jaspers para a Universidade de Basiléia, na Suíça, onde receberá inúmeras visitas de Arendt.
As indagações mútuas, a retribuição de comentários críticos, acordos e desacordos sobre aspectos das obras de cada um aparecem, nas cartas, intercalados a detalhes íntimos e experiências do mundo, distantes, mas sempre interessadas.
Essa permuta intensa e fecunda só cessará sob o efeito de um telegrama que Arendt recebe de Gertrud, mulher de Jaspers, em 26 de fevereiro de 1969: "Karl morreu às 13:43".

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