São Paulo, domingo, 25 de junho de 1995
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Mãe afirma ao Censo que filhos mulatos são negros

CRISTINA GRILLO
DA SUCURSAL DO RIO

Quando Paula Barreto, 36, branca, filha do produtor de cinema Luís Carlos Barreto anunciou que iria se casar com o jogador de futebol Cláudio Adão, 39, negro, comprou uma briga em casa.
A reação de sua mãe, a produtora Lucy Barreto, foi perguntar se ela já tinha pensado que seus filhos seriam mulatos.
``E era o que eu mais queria, ter filhos lindos, que não fossem branquelos como eu e que fossem uma mistura minha e do Cláudio", conta Paula, dezoito anos depois da cena.
Os filhos são dois: Camila, 10 e Felipe, 9. De acordo com a certidão de nascimento, os dois são brancos. Para o censo do IBGE, Paula diz que os filhos são negros.
``Minha maior decepção foi quando as crianças nasceram. Elas eram brancas, por isso foram registradas assim. Mas depois o pediatra me tranquilizou e disse que elas iriam escurecer", diz a mãe.
Cláudio Adão, ex-jogador do Flamengo, Botafogo e Fluminense e atualmente no Volta Redonda, diz que conversa sempre com os filhos sobre a questão da cor.
``Digo que eles devem ter orgulho de sua cor e não podem trazer desaforo para casa", afirma.
As crianças aprenderam. ``As vezes me xingam por causa da minha cor, mas eu não ligo. Sei que é só para tentar me magoar", conta Camila.
Felipe é mais radical. ``Chamo logo de branco azedo e de viado. Acaba logo a brincadeira", diz.
As resistências familiares de ambos os lados foram vencidas e hoje não há mais problemas.
Dificuldades, só quanto ao termo pardo.``Tenho horror a ele. É feio, preconceituoso. Meus filhos são negros e são felizes", diz Paula Barreto.
Pelos critérios do IBGE, todos os descendentes de casamentos mistos são pardos. Assim, o filho de um casal formado por um oriental e um branco é considerado pardo -a mesma classificação usada para o filho de um casal formado por um branco e um negro.
A demógrafa Valéria Motta Leite conta que a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) feita em 1976 detectou 135 cores diferentes da população brasileira - de acastanhada a turva, passando por azul marinho, branca suja, cor de cuia, morena parda, sapecada e outras.
A pesquisa foi feita para subsidiar as investigações sobre a questão da cor no censo demográfico. ``Havia críticas ao fato de o quesito ser fechado (as respostas não eram livres). Na PNAD tentamos verificar a melhor maneira para se descobrir a cor da população. Concluímos que pardo seria melhor", diz Leite. Ela informa que no último censo, os indígenas ganharam denominação própria.
(C.G)

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