São Paulo, domingo, 25 de junho de 1995
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Sócio em 1949 vira personagem da `Grande Arte'

MARIO CESAR CARVALHO
DO ENVIADO ESPECIAL AO RIO

Sócio em 1949 vira personagem da 'Grande Arte'
Dr. Mandrake, o advogado de ``A Grande Arte", pode não ser o alter ego de Rubem Fonseca, mas Wexler é Luiz Weksler, 71. No romance, Mandrake e Wexler são sócios em um escritório de advocacia no Rio. Na vida real, Rubem Fonseca e Weksler foram sócios no mesmo tipo de negócio entre 1949 e o início dos anos 50.
Fonseca e Weksler formaram-se em 1948 na Faculdade de Direito do Rio, que hoje integra a Universidade Estadual do Rio de Janeiro. No ano seguinte, alugaram a sala 1.103 na rua Erasmo Braga, 255, no centro do Rio, a menos de cem metros do Fórum.
Um terceiro advogado, Rinaldo de Melo Moraes, já morto, fazia parte da sociedade.
``Fomos sócios por uns dois anos", contou Weksler à Folha. ``Mas não ganhávamos dinheiro. A advocacia era incipiente."
Foi o fracasso como advogado que empurrou Fonseca para a Escola de Polícia, onde começou a estudar em abril de 1951.
Weksler tentou entrar para a polícia, mas foi reprovado -não tem o olho esquerdo. Manteve o escritório de advocacia na mesma sala até fevereiro último. Em abril do ano passado, teve um derrame cerebral. Perdeu o movimento da perna e do braço esquerdos, mas manteve a fala e a memória.
``Lembro que o Zé Rubem pegou o caso de um rapaz chamado Peres, acusado de tentativa de estupro. Diziam que ele estuprou usando um revólver. O Peres foi absolvido", diz.
Outro caso do advogado Fonseca, o de um falsificador de dinheiro, seria citado mais de 30 anos depois como um dos casos do Dr. Mandrake em ``A Grande Arte": ``Ao chegar ao escritório trabalhei arduamente, redigindo as alegações finais de um difícil caso de falsificação de papel-moeda".
Weksler, um polonês que veio para o Brasil com dois anos, conheceu Fonseca na faculdade, em 1945. ``Eu tinha um automóvel americano, um Plymouth, quando ninguém tinha automóvel. Levávamos duas amigas e namorávamos no carro. Íamos ao Arpoador".
Pelo menos a um baile de Carnaval Weksler lembra-se de ter ido com Fonseca. ``Foi o Baile da Balança, feito por advogados no Automóvel Clube. Íamos para pegar mulher. Escreve aí. É assim que se dizia: pegar mulher."
Fonseca, segundo Weksler, já escrevia quando eram sócios. Tinha idéias no meio do expediente. ``Ele falava: `Vou embora, vou escrever um conto'. E saía".
Um dos contos que Fonseca deixou no escritório foi inscrito por Weksler, sem que o autor soubesse, num concurso do ``Jornal de Letras". Ele não se lembra do título, mas diz que não foi premiado.
Weksler leu o conto ``Mandrake" (1979), no qual aparece um esboço de Wexler, mas não conseguiu chegar ao fim de ``A Grande Arte". ``Não consegui ler até o fim. Não, não me agradou. Comecei a ler, não achei envolvente e parei. Zé Rubem trocou uma letra do meu nome. O certo é Weksler: dáblio, é, k, esse, ele, é, erre. Não tem xis, mas não tem problema".
Com xis é o nome de Haskell Wexler, diretor de fotografia do cinema americano.
Ele nem se lembra da frase usada no conto ``O Caso de F.A.", do livro ``Lúcia McCartney", que seria o seu bordão à época do escritório, segundo Ivan Vasques: ``Quem pensa que advogado trabalha com a cabeça está enganado, advogado trabalha com os pés". Diz Weksler: ``Devo ter dito isso. Era metido a engraçadinho".
Fonseca gostava tanto da frase que a usou na versão revista de ``A Grande Arte": ``Um bom advogado, dizia Wexler, tem que ter boa cabeça e boas pernas".
(MCC)

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