São Paulo, segunda-feira, 3 de julho de 1995
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'Novos crentes' valorizam riqueza material

CLÁUDIA TREVISAN
DA REPORTAGEM LOCAL

Os ``novos crentes" adotaram a teologia da prosperidade. Pregam a felicidade na Terra, valorizam a riqueza material e deixam de lado restrições sobre a forma de vestir.
Adeptos de igrejas como a Renascer e a Universal do Reino de Deus (Iurd), eles são chamados de neopentecostais.
O ``neo" decorre do abandono da estética e das restrições clássicas das igrejas pentecostais.
As mudanças no comportamento dos neopentecostais foram estudadas nos últimos cinco anos pelo sociólogo Ricardo Mariano, que acaba de defender na USP (Universidade de São Paulo) a tese ``Neopentecostalismo: Os Pentecostais Estão Mudando".
Em 239 páginas, Mariano aponta traços do que considera a ``modernidade" das igrejas neopentecostais. Nesse grupo, além da Renascer e da Universal, ele inclui a Nova Vida, a Internacional da Graça de Deus e a Comunidade Evangélica Sara Nossa Terra.
Todas elas inovaram nos chamados usos e costumes e, principalmente, na maneira de encarar a vida terrena. ``Deus não nos criou para termos uma vida miserável na Terra", repetem os pastores da Igreja Universal, a mais radical nesse processo de transformação.
A idéia de que privações materiais na Terra garantem a felicidade no Paraíso -comum nas pentecostais- foi abrandada, diz Mariano. Para as novas igrejas, surgidas principalmente na década de 70, a felicidade terrena ganha um destaque inédito.
Nos costumes, a mudança é visível. Não existem prescrições rígidas sobre roupas nem preconceito contra pessoas que exercem atividades ligadas ao lazer, como artistas ou jogadores de futebol.
Pelo contrário, Mariano diz em sua tese que a ``Folha Universal", publicação oficial da Iurd, chegou a dar ``dicas" sobre biquínis para o verão. Para as mulheres de tipo ``mignon", dizia o jornal, ``os modelos meia-taça são perfeitos, pois devido a seu corte especial, dão a ilusão de seios maiores".
A pregação da prosperidade terrena é justificada com uma série de princípios que Mariano chama de ``teologia da prosperidade".
Segundo ele, essas igrejas se adaptaram às promessas da sociedade de consumo, aos apelos do lazer e às opções de entretenimento criadas pela indústria cultural.
``Essa religião, ou se mantinha sectária e ascética, aumentando sua defasagem em relação à sociedade e aos interesses ideais e materiais dos crentes, ou fazia concessões", diz a tese.
A prosperidade financeira é incentivada pelos pregadores. Em algumas igrejas, como a Universal, há cultos específicos para empresários. Mariano resume o princípio que motiva os fiéis: ``Você vai prosperar se tiver fé em Deus e fizer tudo o que ele pede".
Nessa frase está a chave para explicar a prosperidade financeira das próprias igrejas. Entre o ``tudo" supostamente pedido por Deus, o dízimo e as ofertas ocupam um lugar de destaque. Com a doação às igrejas, os fiéis provam concretamente a sua fé e se habilitam a receber as bençãos divinas.
``Quando pagamos o dízimo a Deus, Ele fica na obrigação (porque prometeu) de cumprir Sua Palavra, repreendendo os espíritos devoradores." A frase, reproduzida na tese, é do bispo Edir Macedo, um dos fundadores da Iurd.
Quanto maior for o risco que o crente assumir ao fazer a oferta, maior será sua chance de ser recompensado por Deus. Os fiéis são incentivados a doar ``carro, casa, poupança, herança, jóias, caminhão etc", diz a tese.
Segundo Macedo, ``é necessário dar o que não se pode dar". E mais: ``o dinheiro que se guarda na poupança para um sonho futuro é que tem importância, porque o que é dado por não fazer falta não tem valor para o fiel e muito menos para Deus".

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