São Paulo, segunda-feira, 3 de julho de 1995
Próximo Texto | Índice

Geração 80 deixa poucos sobreviventes

DANIEL PIZA
DA REPORTAGEM LOCAL

Um espectro ronda a pintura brasileira. São ex-semideuses, ex-habitantes de um Olimpo que dividiam com estrelas de rock e artistas de TV, ex-queridinhos de crítica e mercado: a Geração 80.
Mais rótulo que referência, mais nostalgia que ruptura, a Geração 80 ganha a partir de hoje outra retrospectiva, na Galeria do Sesi, que expõe as obras dessa geração que fazem parte da Coleção Gilberto Chateaubriand, do Museu de Arte Moderna do Rio.
Ela gostava de telas grandes, de muitas cores e pinceladas livres, de festas, drogas e rock'n'roll, de aparecer nos jornais e frequentar a alta sociedade. Compunha grupos -a Casa 7, o Ateliê da Lapa-, falava de tendências mundiais e, na mesma onda, vendia bastante.
Havia quem pagasse. ``Colecionador jovem quer comprar artista jovem", sentenciava João Sattamini, o grande marchand da geração que surgia com uma pintura ao gosto dos novos-ricos dos anos 80 e dotada, nas palavras do crítico Frederico Morais, de ``indiscutível vocação publicitária".
Faz agora dez anos que a Geração 80 brilhou no olho do furacão artístico: a 18ª Bienal Internacional de São Paulo, curada por Sheila Leirner, que a ela dedicou toda uma seção, ``A Grande Tela".
A crítica se refestelou nos adjetivos: era a volta da pintura, numa clave dionisíaca, que traduzia na liberdade das pinceladas um estilo de vida informal (veja cronologia e glossário no quadro abaixo).
``Arte é vida", diziam esses artistas. Se observassem que a frase soava a clichê, respondiam: ``Mas é um clichê legal". A historieta foi contada por Morais, um dos principais promotores da geração, que na época exaltava ``o reencontro com a emoção e o prazer de pintar" promovido por ela.
Claro que, em comparação aos EUA, aqui tudo ocorreu em ponto menor. Lá, impulsionado pelo esnobismo financeiro dos ``yuppies", o mercado fez de artistas como Julian Schnabel, Robert Longo, Jean-Michel Basquiat e David Salle ricaços que, com a maior desenvoltura, posavam para capas de revistas como ``Vanity Fair" e ``Vogue".
Hoje, porém, esses semideuses vivem seu crepúsculo, como observou reportagem recente do jornal americano ``The New York Times". Aqui, já em 1990 Marcus Lontra, do MAM-Rio, curador da exposição no Sesi, escrevia: ``O sonho acabou mais uma vez".
Concluída a década, o mercado de arte mundial e local fechou a temporada de cifras astronômicas. Os artistas envelheceram; muitos se perderam em sua própria vaidade. A Aids obscureceu o cenário antes festivo, levando talentos como Jorge Guinle e Leonilson.
``Estamos em período de baixa. O artista está marginalizado, hibernando", resume um dos sobreviventes mais ativos, o pintor carioca Daniel Senise, 40.
``A Geração 80 fez a festa... para um país que não houve", escreve Lontra no catálogo da exposição. Mas a festa foi uma grande ressaca: a amostra do Sesi prova que, de grande pintura, a Geração 80 pouco serviu à história.
É hora do balanço. Com essa intenção, a Folha falou com quatro artistas para quem a Geração 80 foi mais que uma galera furada.

LEIA MAIS
sobre a Geração 80 à pág. 5-9

Próximo Texto: Mostra no Sesi reúne 58 obras
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.