São Paulo, sexta-feira, 14 de julho de 1995
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Diagnóstico preciso

JANIO DE FREITAS

Um estudo sigiloso do Conselho Fiscal do Banco do Brasil, datado de 10 de julho, adverte o Conselho de Administração para a impropriedade das demissões em massa como solução para os problemas graves do banco, originados, como o documento demonstra, do uso político do BB nos governos dos últimos dez anos (ou seja, do governo Sarney para cá, cujas práticas, como é notório, prosseguem no atual).
Convém notar, desde logo, que o Conselho Fiscal não é composto por funcionários do BB. Seu presidente, Claudiano Manoel de Albuquerque, signatário do estudo, é coordenador de Programação Financeira do Ministério da Fazenda. Outro dos membros, Paulo França, integra a assessoria da secretaria executiva, também do Ministério da Fazenda. O estudo é, portanto, de técnicos ocupantes de cargos de confiança no governo.
No último decênio, lembra o estudo, o BB esteve sob ``uma sequência de administrações visceralmente opostas em suas propostas e realizações", todas efêmeras em razão da brevidade de cada gestão: ``A transição de cinco diferentes administrações em cinco anos impõe indeléveis danos ao planejamento."
O que o estudo ``depreende da nefasta situação hoje enfrentada (pelo BB) é que a responsabilidade recai, sem qualquer sombra de dúvida, sobre o acionista majoritário (o governo, em nome da União), a quem cabe assumir o ônus e equacionar a solução". A coragem do documento, se faltassem outras evidências, é clara na afirmação de que o ``acionista majoritário", se fugir ao ônus e à solução adequada", o fará sob pena de incorrer nas cominações a que se reporta o art. 117 da lei 6.404/76".
A fonte numérica dos problemas do BB é posta a nu: ``Atendo-nos ao prejuízo observado até maio, da ordem de R$ 1,730 bilhão, em contrapartida aos reduzidos efeitos que se espera alcançar com o programa de demissão de funcionários, que, por sua vez, também implica outros custos advindos das próprias indenizações, contratação de empresas de consultoria etc., remetemos nossa atenção para outros números que, estes sim, despontam como reais transgressores dos princípios básicos de saúde financeira de uma instituição sólida como o Banco do Brasil". Seguem-se os rombos:
``Títulos utilizados pelo Tesouro Nacional nos últimos aumentos do capital (do BB), à época de suas emissões: US$ 101,7 milhões. Valores não-recebidos na alienação da Acesita: US$ 730 milhões. Dívida discutida com o governo federal (e do governo federal): US$ 2,408 bilhões. Outras sob ação judicial -INSS, Receita Federal e Mendes Jr.: US$ 4,065 bilhões. Em negociação com o Banco Central (dívida do BC): US$ 591 milhões. Total da inadimplência sob responsabilidade do setor privado: US$ 10,442 bilhões". Total de créditos vencidos do BB, em relação ao prejuízo até maio de R$ 1,730 bilhão: R$ 16,870 bilhões (US$ 18.337.700).
Esse total ``corresponde a aproximadamente três vezes o patrimônio líquido do banco". Mas nele ainda ``não estão computados os prejuízos causados pelas alternadas decisões negociadas entre os Poderes Legislativo e Executivo de crédito rural -caracterizando-se como infringente da lei 6.404/76". O estudo não computou, também, ``os custos impostos ao banco na cessão de funcionários ao Executivo, hoje de aproximadamente 450 servidores".
O Conselho Fiscal lembra que só a cobrança dos débitos vencidos entre janeiro e maio, totalizando R$ 2,3 bilhões, já reverteria o atual quadro negativo das finanças do banco. Relembra suas sugestões anteriores, em relação a agências no exterior, ``enfatizando a repartição de recursos, melhor aproveitamento de agências e subsidiárias e extinção das deficitárias". No âmbito interno, reclama pelo corte de desperdícios e diminuição das despesas administrativas, que, ``no corrente ano, permanecem em torno de R$ 100 milhões". Se lembra e relembra, é porque não foi ouvido.
Sobre as demissões em massa, o estudo do Conselho Fiscal não é menos claro e enfático: mesmo que demissões sejam inevitáveis, ``não são capazes de produzirem os efeitos necessários à reversão do cenário deficitário que se vem agravando nos últimos meses, mantendo perspectivas sombrias para o próximo semestre". As demissões ``estão voltadas para o segmento menos responsável pela desordenação a que foi submetido o banco neste decênio". Já em 1990, o então presidente, Alberto Policaro, deu início à redução do número de agências, além de incentivo a demissões, daí não resultando benefícios palpáveis, nada obstante os custos demandados".
Demissões, na conclusão do conselho, devem ``inserir-se em contexto mais amplo, contemplando a efetiva participação do Tesouro Nacional na solução dos problemas, inclusive mediante quitação de seus débitos para com o banco".
É indiscutível a dupla responsabilidade do governo na situação dramática do Banco do Brasil. Com seus últimos antecessores, por ser criador do problema; sem aqueles, por aplicar tratamento inadequado. O mesmo, aliás, aplicado no governo Collor, sobre o BB e sobre o funcionalismo em geral, e que levou a equipe de montagem do programa (esquecido) de Fernando Henrique a esta conclusão: ``Collor destroçou todo o aparelho de governo".

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