São Paulo, domingo, 16 de julho de 1995
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A nova etapa

Entidade pede ``moratória para a imigração"

MARIA ERCILIA
DA REPORTAGEM LOCAL

Um dos reflexos da mudança de atitude nos EUA com relação à imigração é o aparecimento de organizações como a Fair (Federation for American Immigration Reform). A Fair defende uma ``moratória para a imigração" nos Estados Unidos e cobra de seus membros ``doações" (dedutíveis do imposto de renda) de US$ 25, US$ 50 ou US$ 100.
Os anúncios da Fair apresentam números e estatísticas, numa simulação de imparcialidade, ao longo de ``sete razões" para reduzir drasticamente o fluxo de imigração no país (leia anúncio abaixo). O que chama a atenção no teor da argumentação da Fair é sua semelhança com o tom habitual das associações de defesa de minorias. O ``establishment" incorporou o discurso defensivo das ``ondas" culturais que o ameaçam, indiferenciando até certo ponto o dominante e o dominado. Ambos reclamam de falta de espaço, de dinheiro, de emprego, e reclamam no mesmo diapasão.
Ora, isso não pode dar certo. As intermináveis e específicas reclamações de grupos minoritários precisam do sentimento de culpa do americano ``imperialista". Quando este abandona o trono e entra na fila das reivindicações, quem vai patrociná-las?
É um efeito irônico do marketing da diversidade cultural, que sempre encobriu o brutal desejo americano de homogeneidade. De Hollywood ao MacDonald's, a cultura da América dá enorme valor à padronização, à garantia do final feliz e do hambúrguer sempre com o mesmo gosto. O ideal democrático encobre uma ditadura cultural do médio, que transforma o excepcional em aberração, independentemente de juízos de valor.
É ingenuidade pensar que o abalo que a identidade nacional americana está sofrendo não é traumático ou que a imigração ilegal não traz problemas econômicos reais. Só que, ainda que a reação conservadora em curso consiga reduzir a imigração e os gastos sociais, os Estados Unidos parecem já estar até as orelhas num processo de transformação inevitável e que, no fim das contas, foi posto em movimento por eles mesmos.
A arma das ``minorias" que tomam de assalto os EUA é, paradoxalmente, o número. O que apavora a América hoje é sua face colorida, é a multidão nas ruas que vai se tornando salpicada de sons e tons estrangeiros.
Só para dar um exemplo, pinçado do U.S. Bureau of the Census: população de hispânicos dos EUA em 90: 9%. Projeção para 95: 10,2%. População branca dos EUA em 90: 75,6%. Projeção para 95: 73,7%.
``Brasilização" e ``balcanização", os termos utilizados por Michael Lind para definir a situação americana, descrevem processos que estão acontecendo no país, sem dúvida. E comodamente, porque evocam situações estrangeiras, de países de Terceiro Mundo. Dão a impressão de que o problema vem de fora e pode ser chutado de volta. Mas também encobrem o fato de que o verdadeiro processo é, na realidade, uma nova e inesperada etapa da ``americanização". O sonho de ser do tamanho do mundo virou pesadelo.

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