São Paulo, sexta-feira, 21 de julho de 1995
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'Estou servindo de joguete', diz colecionador

CLÁUDIA MATTOS
DA SUCURSAL DO RIO

`Estou servindo de joguete', diz colecionador
O engenheiro mecânico Leonardo Arruda jamais imaginou que sua paixão por armas fosse se transformar em ``hobby maldito".
Presidente da ABCA (Associação Brasileira de Colecionadores de Armas) e funcionário de uma estatal cujo nome mantém em sigilo, Arruda, 44, está sendo acusado de fazer ``contrabando legal".
A expressão foi usada por Vicente Chelotti, diretor-geral da PF (Polícia Federal) para denominar a importação de duas toneladas de armas pela ABCA, importadas da China e apreendidas pela PF.

Folha - O que a apreensão das armas mudou na sua vida?
Leonardo Arruda - Estou servindo de joguete para a Polícia Federal. Ela não quer que a história morra. Instruí advogados para que todo aquele que vinculou o meu nome ou o da ABCA ao contrabando e ao fornecimento de armas aos bandidos sejam processados. Vou vender caro meu tombo.
Folha - Há quanto tempo o sr. está envolvido com armas?
Arruda - Desde pequeno. Sempre gostei do assunto, sempre me envolvi com isso. Acabou que escolhi esse hobby maldito.
Folha - Desde quando coleciona armas? E quantas tem?
Arruda - Desde 1979. Não posso revelar o número de armas.
Folha - O que leva alguém a colecionar armas?
Arruda - É um sentimento atávico no homem. Tem gente até que acha que tem um homossexualismo latente nesse troço. Eu não ligo. Eu gosto porque gosto.
Folha - O sr. anda armado?
Arruda - Não. Agora, estou pensando nisso.
Folha - O sr. tem medo?
Arruda - A polícia quer me enquadrar como contrabandista. O inquérito caminha para isso. Eu teria iludido o Exército e trazido armas que não poderia trazer.
Folha - Por quê?
Arruda - Tem uma politicagem danada em cima disso. A PF briga com todo mundo, com a Receita, com o Exército e eu sou a peteca no meio. Estou sendo chutado pelos dois lados. A divulgação da lista dos colecionadores pelo Exército me decepcionou muito. Eles botaram em risco a segurança dos colecionadores e, em última análise, a segurança pública.
Folha - O sr. afirma que as armas importadas são semi-automáticas. Elas podem pode ser convertidas em automáticas?
Arruda - Sim, mas com um custo alto. Eventualmente, pode ser mais barato obter direto uma arma automática do que fabricá-la a partir de uma semi-automática.
Folha - Os sócios poderiam vender armas para traficantes, que as modificariam?
Arruda - Cá entre nós, a AK-47 é uma meleca. O AR-15 também é. Garanto que no mercado negro daqui compra-se armas muito mais eficientes que o AR-15 e o AK-47 sem ter tanto problema.
Folha - Houve subfaturamento na compra das armas?
Arruda - Não. É só pegar cópia de catálogos para ver o preço.
Folha - A ABCA vai tentar reaver as armas?
Arruda - Vamos lutar. A questão tem seu lado político e, quando descamba para o lado político, os juízes não têm coragem de julgar de acordo com a legalidade.
Folha - Quanto custou cada peça?
Arruda - Paguei US$ 125 pela réplica do AK, que no mercado negro é vendido por US$ 3.000. Mercado negro é mercado negro. Na China custa US$ 125. Dependendo da quantidade, compra-se até mais barato. Não dá para competir com os chineses.

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