São Paulo, segunda-feira, 24 de julho de 1995
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Erundina se diz alternativa do PT para a Presidência

CARLOS EDUARDO ALVES
DA REPORTAGEM LOCAL

A ex-prefeita Luiza Erundina teme que a preferência da direção do PT pelo ex-deputado federal Aloizio Mercadante comprometa a ``democracia" da prévia que indicará a candidatura do partido na sucessão paulistana em 1996.
Erundina acha salutar a criação de um novo partido da ``esquerda democrática" e sugere que Luiz Inácio Lula da Silva dispute um cargo legislativo ou uma prefeitura importante. A seguir, os principais trechos da entrevista da ex-prefeita à Folha.

Folha - A sra. tem chance de vencer, no PT, a candidatura Aloizio Mercadante na prévia que vai escolher a candidatura do partido à Prefeitura de São Paulo em 96?
Luiza Erundina de Souza - Hoje, talvez eu não tivesse muita chance na disputa interna. Mas eu começo a ser procurada por vários setores do partido para dizer que vão me apoiar. Espero que o processo seja democrático.
Folha - A sra. espera ou tem certeza de que o processo será democrático?
Erundina - Espero. Primeiro tem uma candidatura já em andamento, articulada pela própria direção do partido.
Mercadante vem com sua candidatura avançando em certos aspectos, o que eu acho que é prematuro em relação ao processo, que está zerado ainda. Já existem alguns grupos formados e algumas iniciativas sendo encaminhadas pela própria direção municipal do partido em torno de sua candidatura.
Folha - Como assim?
Erundina - A preocupação em organizar finanças, campanha e grupo de apoio, tudo diretamente vinculado à sua candidatura. É como se ele já fosse o candidato, está ungido e vamos preparar a campanha, sem ouvir outros virtuais candidatos a candidato.
Folha - Existe algum paralelo entre a sua campanha interna agora e a de 88, quando enfrentou Plínio de Arruda Sampaio para ser a candidata do PT à prefeitura?
Erundina - Sem dúvida. Há de novo uma outra candidatura que tem o apoio declarado das direções partidárias. Então não se percebe a isenção dos dirigentes do partido em todos os níveis e isso é ruim.
Em compensação, hoje eu tenho cacife externo e isso deve contar.
Folha - Mercadante é muito ligado a Lula. Qual o papel de Lula nessa questão?
Erundina - Não só ao Lula. Ele é ligado também aos outros dirigentes. É evidente que mais uma vez eu não sou a candidata da preferência da direção.
Folha - Qual a diferença política entre a sra. e Mercadante?
Erundina - Há diferenças de perfil. Ele é uma candidatura mais de classe média, com trânsito em setores mais intelectualizados.
Se ele for escolhido na prévia, tem que se inserir nos setores populares, que são a imensa maioria. Eu já tenho essa inserção.
Folha - A sra. discutiu a candidatura com Lula?
Erundina - Sim. Essa questão foi colocada e ele estimulou a possibilidade de eu ser candidata. Mas não tenho ilusões de que sou a candidata dos sonhos dele.
Folha - A sra. admite a possibilidade de disputar a prefeitura por outro partido?
Erundina - Não. Quero sair pelo PT. Há um processo de reorganização partidária no país e é difícil saber como é que vai ficar o quadro até outubro de 96, mas quero ser candidata pelo PT.
Folha - A sra. acredita na formação de um nova legenda de esquerda?
Erundina - Acredito que o Brasil comporta outros agrupamentos políticos dentro do ideário socialista, que poderia avançar esse campo da esquerda democrática. Seria salutar. Seria uma outra alternativa democrática, popular e de esquerda.
Folha - E como a sra. vê a atuação do PT?
Erundina - Embora esteja credenciado politicamente, como principal força de oposição, o PT não conseguiu construir uma estratégia, um projeto alternativo capaz, por causa da disputa interna.
O PT está demorando muito a sair disso e se credenciar a ser uma alternativa de oposição competente, responsável e propositiva.
Folha - O PT não é hoje uma oposição competente?
Erundina - Não está sendo uma oposição competente para apresentar propostas alternativas. Até agora, por exemplo, quais são as propostas que viabilizamos em relação às propostas do governo na revisão constitucional, pelo menos na Ordem Econômica?
Ficamos só denunciando e negando. Acho que não é isso que credencia uma oposição.
Folha - Afinal, a sra. defende a criação de um novo partido?
Erundina - Ainda tenho a esperança de que o PT seja esse partido que reúna esses anseios e as propostas de centro-esquerda, mas acho que no momento ele não está sendo.
É necessário, não diria um novo partido, mas um novo campo de discussão.
Folha - Qual o papel que a sra. vê para Lula depois que ele deixar a presidência do PT?
Erundina - O Lula deveria disputar um mandato legislativo, de deputado federal ou senador. Eventualmente, poderia disputar um cargo executivo importante, como as Prefeituras de São Paulo ou de São Bernardo.
Folha - Mas o Lula não será o eterno candidato do PT à Presidência?
Erundina - Ele mesmo rejeita isso. Está na hora de o PT procurar outras opções. O Lula tem muita sensibilidade política e não se coloca como candidato na próxima eleição presidencial. Não estou dizendo que ele não possa vir a ser.
Folha - A sra. se coloca como alternativa?
Erundina - Eu me coloco, com as credenciais que eu tenho, sem falsa modéstia. Tenho experiência executiva e sou uma liderança nacional do PT, queiram ou não.
Não estou me lançando candidata à Presidência, mas potencialmente acho que seria bom para o Brasil uma mulher se dispor a isso, até para quebrar tabus.
Folha - Que balanço a sra. faz do governo FHC?
Erundina - Infelizmente, ele está decepcionando até mesmo quem o apoiou. É refém do PFL, que é quem governa efetivamente.

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