São Paulo, quarta-feira, 26 de julho de 1995
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Vem aí a Pornobrás?

ALTAIR BRASIL

Com o pretexto de evitar privilégios e de impedir o estímulo a publicações ``de baixo nível e, até mesmo, revistas pornográficas", o deputado Eduardo Jorge acaba de propor uma emenda constitucional para que se retome a censura de livros, jornais e revistas.
Talvez o deputado petista não concorde com essa interpretação, mas a volta da censura às publicações está implícita em sua proposição: sugere o deputado que se suprima a alínea ``d" do Inciso V da Constituição Federal, que garante a imunidade tributária sobre livros, jornais, periódicos e sobre o papel destinado à sua impressão; propõe, em seu lugar, a isenção desses impostos apenas para as publicações ``de interesse cultural ou educacional".
Ocorre que a questão central das imunidades estabelecidas no artigo 150 está precisamente vinculada ao artigo 5º da Constituição, que trata dos direitos e garantias, entre as quais a liberdade de expressão e de pensamento, e ao artigo 220, que trata especificamente da censura. E é justo que seja assim: sem as imunidades, com a produção bem mais cara, os jornais e as revistas, por exemplo, perderiam sua independência, por debilidade econômica; além do mais, as camadas economicamente menos favorecidas ficariam à margem do mercado da comunicação escrita, uma clara agressão às conquistas sociais arduamente alcançadas nos últimos anos.
Não é tudo: preconizando tratamento tributário diferenciado às publicações de interesse cultural ou educacional, o deputado deseja, implicitamente, que se defina o que é cultural ou educacional. Deseja, naturalmente, que alguém se encarregue desse julgamento e que esse alguém, enfim, decida sobre o que pode e o que não pode ficar isento de impostos. Quer o deputado Eduardo Jorge, em última análise, a volta da censura.
Instaurada a ``Pornobrás", órgão que avaliaria o que é publicável no país, seria preciso, para que se lesse a média de 62,5 novos títulos lançados por dia (12 mil publicados em 1994 e 15 mil previstos para 1995), que se empregassem no mínimo 65 censores, para ler um livro por dia, 20 dias por mês, o ano inteiro... Sem falar, é claro, da leitura prévia dos jornais e revistas de todo o país. Essas são considerações meramente matemáticas, pois nem é preciso discorrer sobre o que significaria ter alguém, ou um órgão, ou uma comissão, julgando o valor moral do que se escreve no país. Aliás, 50% do que é editado, hoje, no Brasil, se restringe ao livro didático. Já vimos esse filme -esse, sim, pornográfico.

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