São Paulo, quinta-feira, 27 de julho de 1995
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Prêmio ao genocídio

CLÓVIS ROSSI

SÃO PAULO - Seria um alento para a civilização a condenação pela Corte Internacional de Justiça, anteontem, de Radovan Karadzic, líder dos sérvios da Bósnia. Pena que seja inútil.
Karadzic é acusado de genocídio, crimes de guerra e contra a humanidade. Exceto entre os sérvios, não parece haver quem discorde da condenação.
O habitual, no mundo, é que os vencedores julguem e condenem os derrotados, sempre depois de derrotá-los. Foi assim no exemplo mais famoso, o dos tribunais de Nurembergue (Alemanha), que julgaram os criminosos de guerra nazistas.
Ao serem levados ao banco dos réus, todos eles já haviam sido presos ou estavam foragidos, mas, em todo caso, derrotados.
Não é o caso de Karadzic. Ao contrário: pelo menos por enquanto, ele é um vencedor. Tanto que, no mesmo dia em que a Corte de Haia anunciava a sua condenação, os seus comandados estavam tomando a cidade de Zepa, um dos últimos bastiões dos muçulmanos bósnios.
Outro bastião, Bihac, está completamente estrangulado e não deve demorar muito para cair. Restará, então, apenas Sarajevo, a martirizada capital da Bósnia, sitiada há três anos e que não pára de sangrar desde então.
É por isso que a condenação de Karadzic é inútil. Quem vai prendê-lo para executar a pena determinada pela mais alta corte de Justiça do planeta?
Coincidência ou não, enquanto a corte deliberava em Haia, a Nato, a aliança militar dos países ocidentais, também deliberava em Bruxelas, sua sede. Decidia como defender as forças de paz (paz?) das Nações Unidas que deveriam proteger os bastiões muçulmanos dos ataques sérvios.
Não chegaram a um acordo conclusivo, menos porque seja de fato difícil armar uma estratégia militar e mais porque não querem derramar uma gota de sangue de seus próprios soldados na arena de conflito armada na Bósnia.
A consequência mais provável dessa pusilanimidade ocidental será a de se ver, pela primeira vez, que eu saiba, um genocida condenado chefiando uma nação ou, ao menos, um pedaço dela. Belo exemplo.

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