São Paulo, sexta-feira, 4 de agosto de 1995
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Brando reina soberano em 'Don Juan DeMarco'

SÉRGIO AUGUSTO
DA SUCURSAL DO RIO

``Don Juan DeMarco" é uma comédia romântica comprometida com a tese de que este mundo é (ou deveria ser) dos loucos. O louco, no caso, não se faz passar por Napoleão, mas pelo mítico Casanova espanhol. A caráter e tudo. Ninguém nota quando ele sai pelas ruas fantasiado de Zorro. Só em Los Angeles isto seria possível.
Encarnado pelo versátil e talentoso Johnny Depp, só lhe dão atenção quando ele ameaça se jogar do alto de um prédio. Demovido do tresloucado gesto por um astucioso psiquiatra, acaba internado numa clínica para loucos mansos, onde continuará se exercitando na arte que melhor domina, a da sedução. Mas as enfermeiras não serão as únicas a cair na sua lábia.
A maior conquista de Don Juan DeMarco termina sendo o psiquiatra que lhe salvou a vida. Conquista platônica, bem entendido. ``Don Juan DeMarco" é uma comédia heterossexual, com duas morenas de fechar o comércio.
Em vez de seguir os traços de Molina, Molière, Goldoni e outros que também fizeram do herói sevilhano um libertino cético e demoníaco, Jeremy Leven, estreante na direção, preferiu o modelo consagrado por Lord Byron, no século passado. Don Juan DeMarco, portanto, é um sedutor seduzido, um ``charmeur" espontâneo desde a mais tenra idade, que um dia se deixa flechar por cupido e descobre a dor-de-cotovelo. É um amor desfeito que o leva ao suicídio. E ao divã do dr. Mickler.
Foi Johnny Depp quem fez questão de ter Marlon Brando no papel do psiquiatra. Amigo de Francis Ford Coppola, produtor do filme, Brando aceitou. Depp sabia o risco que estava correndo. E o que era de se prever, aconteceu. Mesmo desfigurado pela gordura, Brando, repetindo o feito de ``Um Novato na Máfia", rouba o espetáculo. Cevado como um cetáceo, paira em cena absoluto, dominando-a com o volume do corpo e aqueles truques de gestos e olhares langorosos com que se consagrou.
Com 31 anos, Depp já foi Edward Mãos de Tesoura, Gilbert Grape, Ed Wood e Don Juan. Quando tinha a mesma idade, Brando já havia sido Stanley Kowalski, Emiliano Zapata, Marco Antônio, Terry Malloy e Napoleão. Hoje, já setentão, ganha fortunas para se deleitar diante das câmeras e imantar a platéia. É um caso único na história do cinema; um Don Juan da imagem.
A imprensa americana adorou ``Don Juan de Marco". Um crítico chegou a qualificá-lo de ``histericamente engraçado". Ora, histericamente engraçado é ``Quanto Mais Quente, Melhor". Esta fábula moderna sobre o donjuanismo raramente tem graça. Faltou-lhe o principal, um Billy Wilder.

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