São Paulo, quarta-feira, 9 de agosto de 1995
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Entendimentos para a reforma da Previdência

<UN->REINHOLD STEPHANES

A reforma não mexerá nos direitos dos 16 milhões de aposentados e pensionistas do INSS
REINHOLD STEPHANES
O Congresso reabriu seus trabalhos e a reforma da Previdência Social encontra-se na ordem do dia, aguardando constituição de Comissão Especial. Dizia-se que a admissibilidade não seria aprovada. Pois foi, e com larga margem de votos.
O presidente Fernando Henrique Cardoso tem dado uma efetiva demonstração de interesse pelas reformas que prepararão o país para o desenvolvimento, empenhando-se com serenidade, seriedade e responsabilidade. Desde o começo, entendi que a reforma teria três estágios probatórios:
1) de sua elaboração e proposta. É certo que há um consenso de especialistas e técnicos em previdência de que a reforma é necessária e inadiável. Mas não será fácil promover os ajustes e vencer os privilégios;
2) de seu encaminhamento, no Congresso, sob o cerrado fogo de pressões e contrapressões, legítimas. Os grupos contrários se revelaram muito rápidos e eficientes na descaracterização da reforma, na maioria das vezes com argumentos falsos;
3) de sua aprovação, respeitando os princípios universais de previdência e considerando as realidades próprias de nossa civilização.
Por isso mesmo, aceitei com desprendimento as críticas, inclusive as mais contundentes, feitas sob o clima de emocionalismo que rastreou a apresentação da reforma. Gratifica-me a solidariedade do presidente da República, dos ministros determinados em redesenhar o Estado, controlar o déficit público e devolver à União, Estados e municípios sua capacidade de poupar e investir.
Uma crítica, porém, me pareceu inaceitável, a de que o projeto não teria consistência, conteria erros grosseiros, seria um amontoado de propostas desconexas.
O projeto da reforma não fluiu de uma só pessoa. Reuniu propostas, sugestões, indicações, recomendações de inúmeros relatórios de comissões especiais e de inquérito, do Senado e da Câmara, além de estudos feitos por técnicos, especialistas e instituições. Consideramos o Relatório Nelson Jobim, derivado dos Relatórios Almir Gabriel e Gustavo Krause, bem como os documentos Cepal, elaborados por profissionais sob encomenda do MPAS.
Faço essa revelação para que cheguemos aos especialistas que atuam em previdência no país. Não levamos em consideração eventuais indicações de instituições externas. A reforma, portanto, se assenta nos princípios universais, na boa técnica e na boa doutrina, ao contrário do que muitos leigos supõem, respeitando basicamente:
1) a criação de um regime geral, universal, público, estatal;
2) adoção de caráter contributivo, igualmente universal, caracterizado por um tempo máximo de contribuição;
3) adoção de uma idade mínima para aposentadoria;
4) definição das aposentadorias especiais em função de exposição ao risco;
5) consideração de fatores demográficos na sua evolução;
6) consideração de fatores atuariais na sua sustentação;
7) eliminação de distorções, privilégios, lapsos legais;
8) eliminação das isenções contributivas;
9) identificação de fontes e usos específicos para financiamento do sistema, de acordo com modelo universal;
10) correção das distorções que financiam com recursos da Previdência os benefícios não-contributivos;
11) instituição de uma previdência complementar, acima do teto mínimo, para estimular a poupança interna.
Esses princípios da reforma precisam ser mantidos. A reforma não pode ser desfigurada nesses pontos. Mas para a sua aprovação deve haver amplo entendimento.
O projeto foi apresentado para debates e tem sido imensamente rica a consequência. Mesmo nas escadarias do emocionalismo, há fatos que nos surpreenderam. A manipulação daquele velhinho baiano, de 92 anos, que veio a Brasília afirmar que a aposentadoria dele seria cassada, foi um deles.
O mar de denúncias de nepotismo, favorecimentos, privilégios, marajás, às custas dos cofres públicos, tiraram debaixo do tapete e puseram sobre a mesa um precioso conjunto de injustiças e iniquidades. Os que se arvoraram em puxar o cordão contra a reforma agora estão na desconfortável posição de defensores de odiosos privilégios.
Penso que a regra de transição abriu novos espaços para aprovação da reforma. Vejamos o caso dos professores primários. Na realidade, os professores primários deveriam ganhar bem, trabalhar em condições dignas e por mais tempo e se aposentar bem. Esse é um fato de política educacional.
O que ocorre na prática é que os professores ganham mal, trabalham em condições desfavoráveis e por pouco tempo, se aposentam cedo e mal. Depois voltam ou às escolas ou a outro emprego para assegurar sua sobrevivência. A Previdência, de fato, acabará pagando uma conta sem contrapartida. As pessoas contribuem em regra 25 anos e passam de 30 a 35 anos, em média, recebendo.
Sem prejuízo das regras gerais, pensemos na reforma e façamos uma regra de ajustes para os professores, enquanto não se encontra uma solução para a causa do problema.
O mesmo se aplica, por razões inversas, ao Ministério Público, onde as pessoas ganham bem, trabalham e contribuem pouco e se aposentam cedo e bem. Por que não trabalhar mais, contribuir e se aposentar mais tarde?
Não há explicações para professores universitários se aposentarem cedo e alguns fazem concurso para a mesma cadeira e retornam à mesma universidade. Não há justificativas para algumas categorias do serviço público se aposentarem com 120% e com valores de cem ou mais salários mínimos.
Não há justificativas para aposentadorias de legisladores com oito anos de mandato, nem para prefeitos e vices, governadores e vices, com quatro anos.
A reforma, como já disse, não mexerá nos direitos dos 16 milhões de aposentados e pensionistas do INSS. Respeitará os direitos adquiridos e as expectativas de direito. A reforma não é contra ninguém.
A reforma objetiva, em síntese, proporcionar segurança aos atuais e futuros aposentados e promover mais justiça social, tornando os brasileiros menos desiguais.

REINHOLD STEPHANES, 55, é ministro da Previdência e Assistência Social e deputado federal licenciado pelo PFL do Paraná.

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