São Paulo, terça-feira, 15 de agosto de 1995
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Ao mestre com carinho

RAUL DAVID DO VALLE JÚNIOR

Tenho por José Gomes da Silva, ex-secretário da Agricultura e Abastecimento de São Paulo (governo Franco Montoro) e ex-presidente do Incra (governo José Sarney), a admiração e o respeito que o discípulo devota ao mestre. Ao bom mestre.
Ele tem sido para mim -agrônomo, trabalhador da reforma agrária e militante das causas sociais- uma fonte permanente de inspiração, como engenheiro agrônomo competente que é, lutador incansável pela reforma agrária, e como homem público honrado e diligente.
Por todas estas razões, não posso deixar de registrar que li com perplexidade seu recente artigo ``Agricultura no Vermelho", publicado na Folha, na edição do Agrofolha de 25 de julho último (página 6-4).
Nele, José Gomes da Silva faz uma referência ao lançamento do Programa Nacional de Reforma Agrária do atual governo, ocorrido em 24 de março do corrente ano, no interior do Ceará, no município de São João do Jaguaribe.
O que deveria ter sido visto como um ato auspicioso, por um velho guerreiro da reforma agrária, foi percebido, contraditoriamente, como uma cena constrangedora, dele merecendo uma descrição negativa.
Baseado em informações de ``pessoas da área", José Gomes da Silva afirmou que as terras não se prestam à exploração sustentável e que foram desapropriadas por altos preços, favorecendo a pessoas alinhadas com o partido do governo (PSDB).
A descrição da cena, como constrangedora, não mereceria de minha parte nenhum reparo, já que é reflexo de uma ótica perceptiva.
Cabe-me, quando muito, lamentar a ofuscação do velho mestre, que não lhe permitiu ver a realidade de forma objetiva.
Olhando com óculos emprestados, José Gomes viu constrangimento onde havia alegria espontânea.
Não obstante, as afirmações subsequentes, sim, merecem reparos.
Não do admirador, mas de quem hoje tem a responsabilidade pela Diretoria de Assentamento do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).
Faço-as com o constrangimento do discípulo que se dirige ao mestre, pedindo-lhe que verifique fontes, levante dados, confronte informações antes de emitir afirmações que podem ser contestadas, por inverídicas ou aleivosas.
Vejamos os fatos:
1- Os imóveis desapropriados -Charneca e Barra do Feijão-, ao contrário do que maldosamente informaram a José Gomes, prestam-se a uma exploração sustentável.
2- Os laudos técnicos existentes são conclusivos. De relevo suave, variando de planas a levemente onduladas, as terras dos imóveis estão localizadas na microrregião do Baixo Jaguaribe.
Por isso, são favorecidas por manchas de solos aluvionais, classificados nas classes 3 e 4, apresentando fertilidade aparente entre média e alta.
3- As terras permitem o plantio de culturas nobres como melão, mamão, pepino, maracujá, acerola e caju, entre outras.
Na pecuária, possibilitam a exploração de animais de grande e médio porte, com o aproveitamento da pastagem natural e a introdução de forrageiras cultivadas.
4- As terras não foram desapropriadas a altos preços.
Os processos podem ser consultados e com certeza são fontes mais seguras do que ``pessoas da área".
5- Seguiu-se, em ambos os casos, um processo rigoroso de levantamento de preços, com pesquisas efetuadas junto a várias entidades públicas e privadas que operam com terras na região.
6- O valor fixado pelo Incra -e dou exemplo de Barra do Feijão- de R$ 200,63 por hectare (10 mil metros quadrados) é significativamente inferior ao preço médio obtido na pesquisa, que foi de R$ 323,60 por hectare.
Quem foi o favorecido?
7- Quanto à coloração política do antigo proprietário, confesso desconhecê-la, mesmo porque entre os documentos requeridos pelo Incra não consta o de afiliação política.
Seja ela qual for, entretanto, é certo que o desapropriado não foi, obviamente, favorecido com o processo.
8- Efetivamente beneficiados foram os 217 trabalhadores rurais lá assentados e que hoje, na região semi-árida, desenvolvem, em terras férteis, uma agricultura sustentável, garantindo para si e seus filhos um horizonte de progresso e bem-estar social.
Presto todos estes esclarecimentos em benefício da verdade, para que o mestre José Gomes, a quem tanto estimo e respeito, assim como a opinião pública, fiquem informados adequadamente da realidade dos fatos e não ao sabor de dados propalados por informantes tendenciosos.

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