São Paulo, terça-feira, 15 de agosto de 1995
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Previdência complementar: aprofundando o debate

LUIZ CARLOS TRABUCO CAPPI

Nos primeiros anos desta década que vai encerrar o século, políticos e cientistas sociais debruçaram-se sobre os eventos dos anos 80 e decretaram que aquela foi a década perdida para o Brasil.
Os mais exagerados chegaram a afirmar que se frustraram expectativas e foram atiradas pela janela oportunidades que o caminhão da história foi recolhendo para futuro aproveitamento. O futuro, é claro, vai depender da vontade política dos seus protagonistas e da disposição de luta do povo brasileiro.
Até o final do século, tal como naqueles anos, o Brasil estará colocado diante de alternativas que supõem a tomada de decisões: escolher entre ser um país fraco ou forte, mais pobre ou mais rico, mais moderno ou menos atrasado. O que não pode -nem deve- é sentir-se tão desimpedido de compromissos como de programas.
Ao tratar de compromissos e programas, refiro-me ao futuro. E, aqui, o futuro é o momento em que o cidadão aposenta-se. O débito cada vez maior na conta da Previdência não é privilégio brasileiro e só não pinta de um vermelho mais forte a contabilidade social de outros países porque, lá fora, ela tem o apoio da previdência complementar.
Em artigo publicado nesta Folha, com o título "Previdência complementar - o lado esquecido da reforma", o ministro da Previdência e Assistência Social, Reinhold Stephanes, sugere que no grande debate sobre a reforma da Previdência esse sistema não esteja merecendo a devida atenção.
Na verdade, o ministro coloca o dedo na ferida da desinformação, ao lembrar que muitos acreditam que a Previdência estará totalmente privatizada depois da reforma só porque entra em cena a previdência complementar. A ser isso verdade, não haveria por que discutir. Eis que, de há muito, existem planos de previdência complementar, aos quais se associam pessoas que pretendem prover o futuro, formando uma reserva previdenciária por meio de entidades fechadas.
Mas, para além das entidades fechadas, existem as abertas, às quais as pessoas aderem como se estivessem filiando-se a um fundo mutualista. Abrem mão de parte dos gastos para investir no seu futuro. Essas entidades são geridas por entidades sérias e fiscalizadas pela Susep e pelo Banco Central. Os recursos depositados nessas instituições formam uma reserva que pode ser resgatada em benefício de quem poupou anos a fio.
Tão importante quanto isso é o fato de que essa poupança poderá ser usada para gerar recursos para o desenvolvimento do país. Dessa forma, exerce importante fator de distribuição de renda. Este é um dos aspectos da reforma que deverá ser observado quando começarem os grandes debates em torno das mudanças na Previdência.
Durante esses debates, outros aspectos poderão ser abordados. Um deles é um tratamento fiscal que venha a favorecer trabalhadores. Isso significará o governo abrir mão, agora, de parte do Imposto de Renda da pessoa física ou jurídica para recuperá-lo mais para a frente, quando o beneficiário se aposentasse e devolvesse para o governo o que deixou de ser arrecadado.
Não se trata de renúncia fiscal. Nem de subsídio. O que se pretende é simplesmente adiar o consumo presente, convencendo as pessoas da importância disso, para o bem delas e do país. Essa hipótese não é aleatória, mas fundada em experiências que têm dado certo em outros países, como nos EUA, onde há, como aqui, a Previdência Social, que é financiada pelo Estado, e os fundos previdenciários e planos abertos.
Os principais planos abertos disponíveis naquele mercado são:
. "Individual Retirement Account" (IRA) - conta individual de aposentadoria em que as pessoas físicas recorrem a entidades de previdência, seguradoras ou bancos. Há uma dedutibilidade quando do ingresso no plano, com tributação somente quando do recebimento do benefício. Existem cerca de 27 milhões de contas como essa -o equivalente a 10% da população norte-americana.
. Uma seção do Imposto de Renda. É conhecida por 401 (K), significando para as pessoas físicas a diminuição de até US$ 9.000 da base de cálculo do Imposto de Renda. Para as pessoas jurídicas, os gastos desse plano são considerados despesas operacionais. Essas contas permitiram ao país ter reservas para investimentos de cerca de US$ 500 bilhões.
Esses planos previdenciários acumularam uma fantástica taxa de poupança interna. Estima-se que a soma do que está investido em previdência privada corresponde a 60% do PIB dos EUA.
Os temas estão lançados ao debate. Decidir sobre essas questões significa garantir o financiamento de um ciclo de crescimento auto-sustentado, independente do desejo de governos, mas de acordo com a vontade da população.
E, enfim, continuar com a cabeça plugada ao Primeiro Mundo por meio da Internet, sem correr o perigo de sentir os pés escorregarem perigosamente no barro para a periferia do Terceiro Mundo.

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