São Paulo, segunda-feira, 21 de agosto de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

A democracia da MTV é a melhor saída para a nação

ANDRÉ FORASTIERI
ESPECIAL PARA A FOLHA

Há algumas semanas ando atazanado com a ``Democracia MTV". Primeiro, tive que votar nas diversas categorias. Depois, são esses anúncios insistentes, enchendo o saco do público para "participar. Você vota, você manda, você decide quem vai ganhar o ``Astronauta de Prata", dia 31, no Memorial da América Latina e uma semana depois, em Los Angeles (EUA).
É justo, é bacana e é muito melhor do que o Prêmio Sharp. Mas tanta democracia já começou a me deixar incomodado.
Democracia é um sistema meio patético, como provaram novamente os acontecimentos políticos da última semana. Principalmente, num país zoneiro e zoneado como o nosso.
Winston Churchill, que desmontou o Império Britânico "na defesa da democracia (pelo menos conceitualmente), era bem realista. Para ele, a democracia é um sistema completamente bunda e só é o menos pior.
Aprovo e assino embaixo. Agora, é uma ilusão intoxicante. A idéia do "você decide vem engambelando geração após geração há, pelo menos, uns 200 anos; talvez desde uns gregos clássicos aí. No planeta Terra, 1995, a liberdade de escolha é basicamente liberdade de compra (supondo que você tenha como comprar).
O chato da compra é que ela é definitiva. Ninguém, fora o Grupo Imagem e a Interwood Marketing, garantem seu dinheiro de volta. Escolheu tá escolhido.
Isso vale para um walkman e vale para o presidente da República. O probleminha é que o planeta Terra, 1995, é nebuloso demais para essas escolhas definitivas.
Escolher um cara para governar um país quatro anos seguidos é um conceito inventado na época em não existia rádio nem TV, mulher não votava e a escravidão era a mola propulsora de quase todas as economias do mundo.
É assim que as coisas são, e quem não gostar, bom, a saída é a luta armada, companheiros.
Mas tenho uma alternativa que pode evitar o derramamento de sangue: a ``Democracia MTV". Não é perfeito. Pode ser muito melhorado. Tenho inclusive sugestões para isso, se alguém me perguntar.
A ``Democracia MTV" tem mais a ver com o mundo moderno do que a democracia representativa como a conhecemos. Proponho o estabelecimento de mandatos de um ano para todos os cargos administrativos da nação. Não é um conceito mais radical do que a estatização de bancos falidos.
Claro que não precisamos votar para todos os cargos. Podemos antes fazer uma experiência com eleição só para um cargo. Sugiro a Presidência da República.
Bom, e quem serão os candidatos? Qualquer um que passar pelo crivo da MTV. Os candidatos dos grandes grupos econômicos (as grandes gravadoras) sempre aparecem mais. Mas sempre entra na programação uns troços meios independentes.
Podemos ter programas diferentes para candidatos diferentes. Tipo um "Clássicos Candidatos, com aqueles que nunca desistem da corrida presidencial. "Feijão Candidatos, com os políticos que têm um sucesso só e saem da cena.
No "Fúria Metal, Gastão destacaria os militares mais radicais de todas as tendências. E no "Lado B, Massari revelaria as propostas mais alternativas.
Todo mês de julho, 128 candidatos concorreriam nas eleições para presidente. Eles só apareceriam em clipes legais de, no máximo, três minutos com visual decente e umas garotas de biquíni.
Os espectadores votariam por telefone (logo, logo teremos TV interativa e a coisa simplifica). O vencedor ganha um ``Astronauta de Prata", a chave do cofre federal e assume entre um show do Sepultura e outro da Marisa Monte.
Quem ganha, tem um ano para empregar todos os amigos, saquear o país e cair fora. Pode concorrer de novo, claro. Mas confio na síndrome do segundo disco, que sempre vende menos que o primeiro, para garantir a renovação no comando do Brasil.
O único risco é pintar um bando de espíritos de porco, como eu, que votem na chapa Beavis & Butt-head. Mas quando a ``Democracia MTV" for implantada, lembre-se: você leu aqui antes.

Texto Anterior: Nova série sobre arte estréia na TV sábado
Próximo Texto: COMPUTADORES FAZEM DEMOS
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.