São Paulo, terça-feira, 22 de agosto de 1995
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Aula prática

ANDRÉ LARA RESENDE

O debate provocado pela intervenção no Econômico foi revelador. Houve erros de todos os lados.
A solução encontrada para reabrir o banco em regime de administração especial, sob o qual estão o Banespa e o Banerj, beirava o ridículo.
Se porque eram estaduais o tratamento dispensado a esses dois bancos foi diferente, então, não seja por isso, estatiza-se o Econômico. Lógica impecável, mas é realmente chamar a todos de cretinos. Ninguém gosta.
Suponha-se que essa fosse, de fato, a intenção do governo. É óbvio que a reversão do decidido pelo Banco Central não poderia ser anunciada por Antônio Carlos Magalhães ao sair do Palácio do Planalto.
A caminhada triunfal com a bancada baiana não ajudou. O senador tinha dedicado o fim-de-semana e a segunda-feira a agredir o Banco Central, seu presidente e os funcionários da maneira mais violenta e irracional.
Se a reversão tivesse alguma chance de ser implementada, a atitude do senador e a forma de seu anúncio a tornaram rigorosamente impraticável.
A ignorância sobre a matéria, sobre o que é redesconto, insuficiência de reserva bancária, patrimônio a descoberto e sob que condições o Banco Central pode e deve intervir em um banco é assombrosa.
Mas todos se acham no direito de criticar o Banco Central, que teria demorado a intervir e permitido que o Econômico chegasse à situação que chegou. Os números são realmente escabrosos.
O Banco Central poderia, e talvez devesse, ter intervindo antes. Imagine o que seriam a gritaria e as pressões. Se agora, que o banco estava inegável e completamente quebrado, choveram acusações de discriminação e perseguição, imagine se houvesse a mais remota chance de questionar a legitimidade da decisão de intervir.
A decisão, ainda que sem as pressões políticas, não é simples. Um banco é um animal complexo e depende da confiança do público.
O Banco Central não pode levantar dúvidas irresponsáveis. É preciso agir de forma rápida e decisiva, no momento em que fica claro que não há mais volta.
A torturada lógica com que expoentes do PFL, defensores da economia de mercado e da independência do Banco Central, saíram em defesa da legitimidade da manobra para estatizar o Econômico e levantar a intervenção foi patética.
Se há dúvida sobre o que seja exatamente independência do Banco Central, a semana passada foi uma ilustração difícil de ser superada sobre o que é a falta de independência.
Quem quebrou o Econômico? Quem tomou da Bahia o dito seu banco? Foi o Banco Central ou foi sua administração? Quem é responsável pelas perdas dos depositantes? Não se ouviu uma única acusação aos controladores e à administração de terem agredido a Bahia. Ao Banco Central, sim.
Nunca as palavras burocrata e tecnocrata foram utilizadas com tal sentido pejorativo e com tanta frequência. O técnico anônimo não tem padrinho.
Mas em um ponto o senador Antônio Carlos Magalhães tem razão. Ao se dar um tratamento especial ao Banespa, quem está sendo privilegiado é o depositante do Banespa. Por que não dar o mesmo tratamento ao depositante de qualquer outro banco? Não há lógica.
Na raiz dessa crise está o tratamento dado ao Banespa e ao Banerj. Uma aula prática da falta de independência do Banco Central.

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