São Paulo, segunda-feira, 4 de setembro de 1995
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O oligopólio e os dicionários

JOSUÉ MACHADO

Existe a palavra "oligopólio?" O leitor Flávio Augusto Ferraz, de Limeira (SP), estranha a falta dela no dicionário Aurélio/Folha. Achou apenas "oligarquia".
O substantivo masculino "oligopólio" existe, sim, e está registrado no Aurélio integral. Em economia, define a situação de mercado na qual, num limitado número de produtores, cada um é forte o suficiente para influenciar o mercado, mas não o é para desprezar a reação dos competidores. Representa no Brasil a situação típica dos supermercados, da indústria automobilística, de pneus e de autopeças, entre muitas outras. No caso de oligopólio, as empresas combinam para definir preços, evitando a concorrência, que os faria cair, para alegria dos consumidores. Por que baixar preços se podem mantê-los altos?
O leitor não deve ficar decepcionado com a omissão porque não há dicionário completo e perfeito. E esse é declaradamente um resumo do Aurélio. Numa versão reduzida, os compiladores, ou enxugadores, são obrigados a colecionar os vocábulos essenciais. Ou, pelo menos, os que consideram essenciais. Sem contar as omissões involuntárias. Console-se porque o Aulete, ótimo dicionário, embora desatualizado, também não registra oligopólio. Não o registram da mesma forma os dicionários de Antenor Nascentes, de Laudelino Freire; e os lusos Cândido de Figueiredo e Lello -todos grandes e abrangentes. Além do Aurélio, o registram o Melhoramentos, o etimológico de Silveira Bueno e o lusitano Morais, de 12 volumes.
Na verdade, oligopólio é um neologismo, embora não tão novo assim, porque Silveira Bueno o anotou em 1968 ou antes. É palavra formada por dois elementos gregos: "óligo" (pouco numeroso) e "pola" (vendedor), que assume a forma "pólio" em monopólio (venda centralizada nas mãos de um só). "Pola" entrou na formação de bibliópola (vendedor de livros), por exemplo. E "pólio" com "mono" (um só) formaram monopólio (venda centralizada nas mãos de um só). Caso da Petrobrás, que detém, ou, detinha, o monopólio da exploração e venda de petróleo e derivados no Brasil.
Quanto à oligarquia, que seu dicionário registra, é formada pelo mesmo "óligo", com "arqui", prefixo que dá idéia de ascendência; esse prefixo tem variantes como "arca" e "arce". Daí monarca (um só chefe), arcebispo (bispo principal). Oligarquia, logo se vê, é o governo de poucos. Poucos representantes de grupos políticos ou de grupos econômicos. Poucos, enfim. Que ninguém diga que é o que ocorre por aqui desde as Capitanias Hereditárias. Não, senhor, como diria Jânio Quadros.
A operação que deu certo
"A operação foi exitosa", disse um técnico da Cetesb, comentando o sistema de rodízio de automóveis imposto para tentar reduzir a poluição em São Paulo.
"Exitosa"? Não dá para ter saudade do Magri nem da Tia Zélia nem da patota toda, felizes para sempre e de vez em quando falando coisas, porque o show continua. O "exitosa" inventado pelo técnico é número paralelo e inexpressivo do grande show. Aliás, será que ele disse "exitosa", do substantivo "êxito", ou "esitosa" ou "ezitosa"? Pode ser qualquer uma delas e não faz diferença, porque essa palavra não existe por enquanto.
Êxito, do latim "exitus", significa saída, fim, acabamento, resultado, sucesso final; resultado feliz, auspicioso ou afortunado; consequência, efeito. E "exit" (éksit), que significa "sai" em latim, é palavra usada em textos de peças teatrais para indicar que uma personagem sai de cena. Mas o que importa é êxito:
"O governo tem obtido êxito nas propostas de reforma constitucional porque todos os atores envolvidos (como dizem eles) querem o bem do povo." (Do discurso de um líder.)
"O êxito do banqueiro correspondeu à expectativa de seus sócios e protetores políticos."
"A proposta para tirar o Banespa do buraco pode ter êxito."
"Os bancos afundaram, mas os responsáveis tiveram êxito: estão por aí lampeiros."
"O êxito da reforma tributária está garantido, porque ela vai beneficiar a maioria e promover a distribuição de renda, graças ao bom Deus."
Por esses exemplos do uso correto de êxito, colhidos como flores em jornais e revistas, pode-se concluir que o técnico poderia ter dito melhor, sem inventar, porque essa palavra não dá margem a vôos:
"A operação teve êxito", ou, "O êxito da operação correspondeu à expectativa."
Por que não, com mais simplicidade?:
"A operação deu certo."
É o que sempre dizem quando a bufunfa chega ao refúgio de Cayman.

JOSUÉ R.S. MACHADO é jornalista, formado em línguas neolatinas pela PUC-SP. Colaborou em diversos jornais e revistas.

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