São Paulo, sexta-feira, 8 de setembro de 1995
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Cantus Cölln canta grátis no mosteiro

LUÍS ANTÔNIO GIRON
DA REPORTAGEM LOCAL

Concerto: Cantus Cõlln
Músicos: Johanna Koslowsky (soprano), Lena Susanne Norin (contralto), Wilfried Jochens e Gerd Türk (tenores), Stephan Schreckenberger (baixo) e Konrad Junghãnel (alaúde e direção)
Quando: Hoje, às 20h
Onde: Mosteiro de São Bento (largo de São Bento, região central de São Paulo)
Turnê: domingo, às 20h30, auditório da reitoria da Universidade Federal do Paraná, Curitiba; quarta, às 21h, teatro São Pedro, Porto Alegre; dia 15, às 21h, Palácio das Artes, Belo Horizonte
Quanto: Grátis

O sexteto Cantus Cõlln, um dos mais brilhantes conjuntos dedicados atualmente à música histórica, chega à metade de sua turnê pelo Brasil com um concerto gratuito hoje, às 20h, no Mosteiro de São Bento em São Paulo.
É uma oportunidade singular de o público conhecer as últimas tendências interpretativas do gênero e um repertório pouco, ou nunca, executado: os madrigais e canções feitos na Alemanha durante a Guerra dos Trinta Anos (1618-1648). Apesar das conturbações do período, os alemães praticavam a pastoral amorosa.
O Cantus Cõlln busca recuperar o clima e os procedimentos interpretativos da época. Com sede em Colônia (Alemanha), devota-se ao restauro das peças do seiscentos.
A turnê tem patrocínio do Instituto Goethe e percorre cidades onde há escolas da instituição. Já foi a Salvador, dia 1º, Brasília, dia 4, e Rio, anteontem. Depois de São Paulo, o grupo vai a Curitiba, Porto Alegre e Belo Horizonte.
O líder do grupo, o maestro e alaudista Konrad Junghãnel, 48, conversou com a Folha no início da excursão. Mostrou-se entusiasmado por voltar ao Brasil depois de 23 anos. Em 1972, excursionou pelo país como alaudista. Além de diretor do grupo, ele assina a premiada integral em CD da obra para alaúde de Bach (1685-1750).
"Viajamos com dois programas: Monteverdi e escola alemã. Pena que nos foi solicitado só o segundo", diz. Ele se confessa fã de Claudio Monteverdi (1567-1643). Gravou desse autor os "Madrigali Amorosi".
O repertório alemão representa o "lado B" do conjunto e está disperso em diversos discos. "Nos concentramos no final do século 17. Nosso compositor mais jovem é Bach pai", diz o alaudista. "Vamos lançar no fim do ano um CD com os motetos dele." Junghãnel guarda uma posição de recuo em relação a Bach: "Ele obscureceu a música que o precedeu". Jogar um foco de luz sobre predecessores de Bach tem sido a tarefa do sexteto.
"Quando nos reunimos para ensaiar, é agradável porque não enjoamos uns dos outros", comenta o diretor. Seu trabalho começa bem antes dos ensaios. Está selecionando o programa para as próximas turnês. Para tanto, vasculha acervos de bibliotecas como as de Berlim e Dresden. Teve dificuldade para encontrar documentos para o repertório alemão: "No século 17, bibliotecas foram queimadas e as partituras, destruídas."
O grupo vai ensaiar os madrigais do príncipe italiano Carlo Gesualdo (1560-1613) e obras que o maestro acabou de descobrir, como as do alemão Johann Rosenmüller (1620-1684).
"Gesualdo era um louco. Matou a mulher e o amante e isso de certa forma se refletiu em cromatismos extremados em suas composições. É um precursor", diz. De Rosenmller, o Cantus Cõlln gravará as "Vésperas", em CD duplo. A partitura foi exumada em Dresden.
"Foi por acaso. Mexia em alguns papéis e me deparei com essa obra-prima que altera a imagem do compositor, até então conhecido por suas peças instrumentais."
O engajamento na onda da música histórica está tão forte que admira a volta das óperas barrocas e não vê com bom olhos a condenação do maestro austríaco Nikolaus Harnoncourt, segundo o qual os músicos-arqueólogos ligaram o piloto automático interpretativo.
"A ópera barroca tem um grande valor musical e poético. Autores como Cavalli e Monteverdi estão no panteão. Harnoncourt era o mais determinista em termos de interpretação há 30 anos. Hoje grava Johann Strauss", critica. Crê que seus confrades de movimento estão chegando à corrente principal erudita: "Agora é imperdoável tocar Bach como Karajan nos anos 80. Até monstros sagrados tipo Claudio Abbado estão regendo os barrocos pela musicologia."
Na guerra estética pela autenticidade, o Cantus Cõlln é a lança mais aguçada.

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