São Paulo, sexta-feira, 8 de setembro de 1995
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A batalha de Deus

Guerras de religião não são uma novidade. São muito poucas as religiões que não se arrogam o direito de impor o seu credo a todos. No Brasil, agora, a antes latente e pouco visível disputa pelas almas chegou escancaradamente à TV.
De um lado, a Rede Globo exibe a minissérie Decadência que, embora a emissora negue, traça um perfil nada abonador dos evangélicos, visando a atacar especialmente o bispo Edir Macedo. Na Record, ligada a Macedo, um pastor da Assembléia de Deus desafia: "Um recado aos herdeiros do império da Rede Globo: um dia, neste país, os evangélicos vão ser a maioria".
Que o debate religioso chegue à TV no Brasil é até um fato positivo. Menos positivo é que esse debate não se trave de uma forma transparente e elucidativa, mas sim de acordo com os interesses particulares dos proprietários de cada uma das redes envolvidas.
Do episódio, pode-se concluir que ambos os lados acertam em cheio o adversário em suas críticas. Edir Macedo, prometendo toda a espécie de "milagres", pretende lotar, no próximo dia 17, a maior casa de espetáculos de Nova York, recebendo generosos dízimos.
O pastor da Assembléia de Deus está correto ao afirmar que os evangélicos têm o direito à confissão de credo, garantido pela Constituição, nos limites da lei. Resta saber se prometer o que não pode ser cumprido está ou não nos limites da lei. Também é inegável que os movimentos evangélicos estão crescendo no Brasil, a ponto de preocupar o próprio papa.
As razões para esse fenômeno são múltiplas e complexas, mas, grosso modo, passam por uma certa apatia da Igreja Católica que não tem sabido acompanhar os novos tempos e pelo caráter extremamente imediático do evangelismo (pagou ganhou, é fácil de entender, e está em perfeita sintonia com o mundo contemporâneo).
De todo esse episódio, é de se lamentar que as igrejas, em suas ambições universalizantes, usem do proselitismo e da propaganda -em seu pior sentido- para tentar impor seu credo a todos. A escolha da religião a ser seguida (ou mesmo o ateísmo ou o agnosticismo) é ou deveria ser uma decisão de foro íntimo de cada cidadão.

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