São Paulo, domingo, 10 de setembro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Novos métodos mudam indústria automobilística e reduzem emprego

ARTHUR PEREIRA FILHO
DA REPORTAGEM LOCAL

Em cinco anos, as 525 empresas hoje responsáveis por 95% do fornecimento de autopeças às montadoras de veículos estarão reduzidas a no máximo 200. A previsão, feita por Paulo Butori, presidente do Sindipeças (Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores), apenas traz para o Brasil um fenômeno que já acontece em outros países.
A indústria automobilística é um exemplo eloquente de uma revolução que está em curso no mundo da produção. Novas tecnologias, facilidade de comunicação, desenvolvimento da informática e escala global: a velha fábrica do filme "Tempos Modernos", de Charles Chaplin, é hoje apenas uma imagem do cinema. Em breve, prevêem alguns, o próprio operário a acompanhará.
A primeira grande mudança no setor de veículos veio com o lançamento dos chamados "carros mundiais". Ou seja, um mesmo modelo, como o Corsa da GM, por exemplo, é produzido em diferentes países, o que representa corte de custos.
Esses veículos utilizam os mesmos componentes e precisam das mesmas ferramentas em todas as fábricas em que são montados.
Consequência: as autopeças podem ser compradas em diversas partes do mundo. O fornecedor será aquele que oferecer melhor preço e qualidade.
Na esteira desse processo de globalização, a Volkswagen desenvolveu o "modelo López", no qual se reduz o número de fornecedores diretos e as fábricas passam a trabalhar no regime de "consórcio modular".
Inventado por José Ignacio López de Arriortúa, vice-presidente mundial da Volks, o consórcio modular (que será implantado na unidade de caminhões e ônibus que a empresa instalará em Resende, Rio) leva os fornecedores de autopeças para dentro da fábrica.
Eles passam a ser responsáveis por conjuntos inteiros de componentes na linha de montagem. Assim, em lugar de a montadora unir várias pequenas peças, cada módulo da fábrica, operado por fornecedores, se encarrega da montagem de uma parte inteira do veículo.
O sistema indica um futuro revolucionário para a indústria automobilística: o abandono definitivo, por parte das montadoras, das tarefas de produção.
"As montadoras querem lidar cada vez menos com a produção de seus automóveis. Elas se vêem como futuras organizações de marketing e vendas, desenvolvendo novos produtos e controlando a cadeia de valor agregado." A conclusão é de um artigo da revista alemã "Manager Magazin", de junho deste ano, sobre as transformações na indústria automobilística.
Segundo a publicação, em unidades-piloto da BMW e da Mercedes-Benz, nos EUA, o percentual de produção própria das fábricas, excluindo-se os motores, não ultrapassa 20%. Os fornecedores fazem o restante do trabalho.
Falando sobre a fábrica da Volks em Resende, López foi claro: "Não haverá funcionários da Volkswagen na linha de montagem."
Mark Hogan, presidente da General Motors do Brasil, concorda que essa é a "tendência da indústria em nível mundial".
Reconhece que a Volkswagen está à frente do processo no Brasil, mas diz que a GM tem planos para, em breve, também adotar o mesmo sistema aqui e em outros países. "Ele dá mais flexibilidade para a montadora".
Paulo Butori, presidente do Sindipeças, diz que a reorganização da produção de veículos que ocorre em nível mundial é "inevitável". Para ele, quem não conseguir acompanhar as novas exigências vai ficar "fora do mercado".
Ele acredita que "pouquíssimas" empresas brasileiras terão condições de integrar o nível A, o seleto grupo de megafornecedores que estará em contato direto com as montadoras.
Uma das razões, segundo ele: o custo do capital, necessário para investir e aumentar a produtividade da empresa, é entre seis e oito vezes mais caro no Brasil do que no exterior.
Para exemplificar a tendência à diminuição de fornecedores diretos, Butori cita o novo carro mundial da Fiat, o projeto 178, que começa a ser produzido no Brasil a partir de abril de 96. "Serão 70 fornecedores, contra os 180 de outros modelos".
E o Fiesta, carro mundial que a Ford começa a produzir no Brasil ano que vem, terá os mesmos fornecedores internacionais utilizados na Europa.
Cai o número de empresas e com ele o nível de emprego. Até o ano 2000, dos 240 mil empregos do setor brasileiro de autopeças 100 mil serão eliminados.
"Esses empregos serão perdidos por necessidade de reestruturação do processo de produção, pelo fechamento de empresas e pela abertura indiscriminada às importações", diz.
Para que o nível de emprego atual pudesse ser mantido, o presidente do Sindipeças avalia que a produção teria de dobrar até o ano 2000 e atingir 3 milhões de unidades. "Acho um sonho".
José Carlos Pinheiro Neto, diretor de Assuntos Corporativos da GM e vice-presidente da Anfavea (associação dos fabricantes de veículos), diz que o desemprego nada tem a ver com a redução do número de fornecedores. "Quem não se relacionar diretamente com a montadora, vai continuar vendendo seu produto para a empresa que entrega o conjunto completo para o fabricante".

Texto Anterior: São José paga a Estado e União o equivalente a 12 casas por mês
Próximo Texto: Entenda o que é a produção em módulos
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.