São Paulo, quarta-feira, 20 de setembro de 1995
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Sinal dos tempos

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO - Autoridades do setor de saúde, agências de publicidade e entendidos de todos os sexos estão procurando um nome que possa servir a uma campanha pelo uso da camisinha no combate à propagação da Aids.
Pode parecer falta do que fazer, mas, no fundo, é uma vocação nacional essa do exagero. Pouquíssimas coisas neste mundo têm tantos nomes, científicos ou não, decentes ou indecentes, para designar determinada coisa.
Vinte e três anos atrás, ao escrever um romance, tive necessidade igual à do ministro Jatene: encontrar um nome asséptico e comportado para a mesma peça do corpo masculino. Recusei o "membro": podia ser um membro do Congresso, das classes produtoras, seria ambíguo. Pensei em "órgão", mas pareceria blasfêmia, as igrejas costumam ter um órgão e não seria piedoso misturar o sagrado com o profano.
Tampouco poderia melindrar o Poder Judiciário adotando o "vara". Afinal temos as varas de família, as varas de órfãos e sucessões etc. Pau seria impatriótico: devemos nossa designação definitiva a um pau avermelhado que os portugueses muito apreciaram e chamaram de brasil, nome que terminou aposentando dois tipos de cruz: a Vera e a Santa.
Terminei optando por "Herodes", nome histórico, embora facinoroso. Tetrarca da Galiléia, exterminador de criancinhas, ele bem podia ser o símbolo de uma campanha contra a explosão demográfica, não contra a Aids.
O imaginário nacional está excitado. Como o assunto é de interesse geral e há urgência em botar a campanha na rua, acho que é caso de o governo baixar uma MP (medida provisória) dando nome à coisa. A cada 30 dias a medida seria renovada, o que daria oportunidade para a nação experimentar todos os nomes de homem, desde Abel a Zute -sendo que este último tem a vantagem de ser menos comum do que Bráulio. Aliás, só conheci um Zute até hoje: era bom sujeito, fazia biscates, morreu velho, de acidente cardiovascular.

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