São Paulo, sexta-feira, 22 de setembro de 1995
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BC condiciona juros a privatização

CARLOS ALBERTO SARDENBERG
DA REPORTAGEM LOCAL

O diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central, Gustavo Franco, deixou ontem o seguinte recado: a taxa de juros no Brasil vai cair de modo consistente e duradouro somente depois de uma intensa privatização de empresas estatais.
Em palestra no Fórum Internacional de Mercados Emergentes, em São Paulo, Franco disse que a taxa de juros permanecerá elevada enquanto não se estabelecer o equilíbrio das contas públicas.
E é para estabelecer esse equilíbrio que são necessárias as privatizações, diz ele.
Essa tese parte do seguinte ponto: a vitória final sobre a inflação depende do que os economistas chamam de ajuste fiscal. O governo estará ajustado quando suas receitas forem suficientes para pagar despesas, investimentos, juros e parcelas da dívida pública.
Hoje, isso não acontece. O governo federal só equilibra suas contas de modo precário: adia pagamento de despesas, não faz gastos essenciais, empurra dívidas para a frente, faz dívida nova para pagar as antigas.
Isso é uma consequência de anos de gastos descontrolados, sempre acima da capacidade de arrecadar receita. Formou-se uma imensa dívida pública, que não pode ser paga com receita de impostos.
Só a dívida do governo federal em títulos vendidos no mercado financeiro já passa de R$ 90 bilhões, o equivalente, por exemplo, a dois anos de salários do todo o funcionalismo federal.
Ou seja, mesmo que demitisse todos os seus funcionários, economizando salários, o governo federal levaria dois anos para saldar só a dívida em títulos.
Há outras dívidas públicas, como a externa (acima de US$ 70 bilhões) e a das estatais (incalculável), que só podem ser abatidas com a venda de estatais.
Como diz Gustavo Franco, as estatais pagam ao governo lucros baixíssimos, que não cobrem nem a correção monetária. Os quatro grandes grupos de estatais, Petrobrás, Eletrobrás, Vale e Telebrás, pagam ao governo lucros inferiores a R$ 100 milhões por ano.
Como a venda das estatais renderá dinheiro suficiente para matar a dívida, faz toda lógica trocar uma pela outra.
Isso feito, fica garantido o equilíbrio financeiro do setor público. O governo e seus buracos deixam de ser causa possível de inflação. Isso porque o gasto excedente do governo é coberto com emissão de dinheiro ou nova dívida -e as duas coisas são inflacionárias.
Eliminado esse problema, com a venda das estatais, as taxas de juros poderão ser baixas, normais, a nível internacional.
Essa é a tese que vem sendo martelada pela diretoria do Banco Central, em resposta às pressões generalizadas pela redução imediata da taxa de juros. Para o BC, a derrubada de juros já equivaleria a afrouxar o combate à inflação.
Juros altos mantêm a atividade econômica desaquecida e isso desestimula aumentos de preços.
Por outro lado, a disputa em torno dos juros demonstra o tamanho da divergência de orientação dentro da equipe econômica. O ministro do Planejamento, José Serra, gostaria de uma redução imediata dos juros, sem esperar pela privatização.
Com um detalhe nessa história: na divisão de tarefas dentro da área econômica, a privatização ficou com o Planejamento, enquanto a política de juros cabe ao Ministério da Fazenda e ao BC.
Assim, quando sustentam que os juros só podem cair depois da privatização, Fazenda e BC estão passando a pressão para o Planejamento, que, aliás, vem sendo criticado pelo atraso nas privatizações.
Inversamente, o Planejamento devolve a pressão quando estimula as críticas segundo as quais os juros altos aplicados pelo BC estão arrasando a economia e aumentando a própria dívida pública.
Não é picuinha. São diferentes concepções de política econômica.

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