São Paulo, sábado, 30 de setembro de 1995
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Uma reforma que democratize o Estado

JOSÉ GENOINO

Se o Estado brasileiro não é patrimonialista no sentido tradicional do termo, é privatista e particularista à medida em que foi e é instrumentalizado por uma elite que pratica o fisiologismo, o nepotismo e a corrupção para agregar privilégios. Para ser público, o Estado precisa garantir os direitos universais de cidadania. Uma reforma administrativa interessada em conferir agilidade e eficácia ao funcionamento da máquina pública não pode deixar de situar os objetivos e interesses da cidadania.
Hoje a crise do Estado, entendida como a incapacidade do poder público de dar respostas às demandas sociais, é uma realidade que atinge países ricos e pobres. O gigantismo estatal e os interesses corporativos agregados em torno da burocracia são apontados como causas de ineficiência. Mas a crise fiscal, de financiamento das políticas públicas, também é uma dimensão importante do precário desempenho do Estado.
Em parte, essa dimensão está relacionada com a hipertrofia do Estado e, em parte, tem a ver com a nova dinâmica da produção capitalista e as consequências do fator tecnológico.
A proposta de reforma administrativa do governo produz alguns avanços, mas carrega também outros equívocos. O mais polêmico refere-se à estabilidade. Penso que a estabilidade pode ser redefinida, mas com a afirmação de mecanismos que impeçam contratações sem concurso público e proibições de demissões por motivos partidários e sindicais.
O projeto do governo falha quando admite contratar por processo seletivo público. Os concursados deveriam ter um período de carência para adquirir a estabilidade de três anos -e não de cinco, como quer o governo. A reforma deve introduzir o princípio da profissionalização do servidor. Um dos aspectos mais importantes desse conceito consiste na adoção de critérios de competência e dedicação para determinar a ascensão na carreira profissional.
A proposta de criar carreiras específicas de Estado para várias funções é correta. Mas os outros servidores não podem ser tratados como funcionários de segunda categoria e ser substituídos por contratações via CLT.
Entre outros aspectos relacionados ao funcionalismo, destaco ainda a necessidade de redução drástica dos cargos de confiança e a proibição da existência de funcionários públicos nos postos de decisão que acumulem, ao mesmo tempo, cargos na iniciativa privada.
A fixação do salário do presidente como teto salarial para outras funções e aposentadorias é uma medida justa. É preciso caracterizar conceitualmente o que é remuneração, para evitar que se acumulem privilégios e vantagens indevidas em forma de gratificações etc.
Para ser efetiva, a reforma deve atender outros quesitos. Destaco a necessidade de garantir a democratização da estrutura administrativa do Estado por meio da publicidade do funcionamento da máquina dos orçamentos e da destinação de verbas, assim como pela garantia da fiscalização da prestação dos serviços por parte dos usuários.
A implantação de mecanismos de controle sobre o funcionamento do Estado, tanto institucionais como sociais, é condição de eficácia e de transparência do poder público. A moralidade pública é uma exigência da legitimidade.

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