São Paulo, terça-feira, 9 de janeiro de 1996
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Barbeiros e cocheiros

ANTONIO CARLOS DE FARIA

RIO DE JANEIRO - No final do século passado os cocheiros de aluguel do Rio julgavam-se socialmente superiores aos barbeiros, conta Lima Barreto. Para marcar essa autovalorização, apelidavam de "barbeiro" quem não tinha habilidade para conduzir uma carruagem.
Pelos padrões da época, hábeis deveriam ser aqueles que conseguissem levar um passageiro do centro a Botafogo em 15 minutos, uma façanha até hoje.
A obsessão pela velocidade é uma característica herdada pelos atuais motoristas de ônibus e táxis. Em nome dela, cometem delitos em cada rua, o que faz com que a cidade ensaie os delírios de transgressão no trânsito do cinema norte-americano.
A subprefeitura da Barra da Tijuca percebeu essa hollywoodinização do cotidiano e espalhou pelo bairro placas que dizem que "velocidade máxima, só no cinema". César Maia deve se orgulhar de seus seguidores.
A qualificação de "barbeiro" também evidenciava aquele que não tinha o requinte e o preparo para tratar com o público. Quanto a isso, os cocheiros de hoje são mais parecidos com os propulsores do que com os condutores dos tílburis e landaus.
Quem dirige pelo Rio já deve ter sido alvo do constrangimento causado por esses motoristas que não respeitam a sinalização e tentam obrigar os outros a também cometer infrações. Os exemplos estão em qualquer lugar e a qualquer hora.
Sem consideração pela vida alheia, pegam ou deixam passageiros em situações perigosas e param sobre as faixas de pedestres. Isso quando param, pois é comum vararem os cruzamentos mesmo com o sinal fechado.
Nesse caldo há ainda o submundo dos transportes piratas. Estimativas do deficiente serviço de fiscalização apontam que há mais de 10 mil taxistas irregulares na cidade, o que seria quase a metade da frota oficial. Esses se misturam com os mais de mil ônibus sem licença que trafegam todos os dias.
A modernidade empresarial é mostrada por cartazes nos vidros dos ônibus legais, que indicam que empresas e motoristas estão passando por programas de qualidade. Diante dos resultados, os cartazes são papel de parede a tampar uma casa em ruínas.

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