São Paulo, quarta-feira, 10 de janeiro de 1996
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Vamos rezar

LUIZ CAVERSAN

RIO DE JANEIRO - O prefeito César Maia deu um sábio conselho para a população da cidade nestes dias de dilúvio: depois de algumas horas de chuva é melhor começar a rezar.
O próprio prefeito indica seus santos de devoção -Nossa Senhora de Fátima e São Jorge-, apostando que deles virá a ajuda contra o dilúvio.
Claro: quando não tem a quem recorrer, resta ao povo apelar para o além.
O ideal seria que o poder público -coincidentemente representado no nível municipal pelo próprio Maia- cuidasse para que não sobrasse apenas essa última e em geral infrutífera saída para os náufragos urbanos que os cariocas acabaram se tornando.
Mas não; deve-se rezar.
Afinal, apesar de chover muito todo começo de ano e apesar de a prefeitura do Rio ter um dos caixas mais bem recheados de todos os governos municipais, pode-se contar nos dedos as iniciativas da prefeitura para conter as enchentes e, principalmente, a queda de encostas provocada pela erosão das chuvas.
A maquiagem da zona sul e suas calçadas vai bem, obrigado, mas os barrancos, que vivem no cai-não-cai, conforme alerta o órgão municipal Geo-Rio, estão sempre lá, a ameaçar os barracões que, como sempre, estão pendurados no morro.
Mas, ok, vamos rezar, e o Cristo Redentor está aí para isso mesmo, ou seja, para estimular a fé cristã, ele também lá de cima de seu morro, ainda bem que mais sólido porque composto do granito multimilenar do Corcovado.
De seu pedestal o Cristo pode inclusive observar que os alertas do Rio-Geo têm uma função prática: avisam quais são os locais onde a prefeitura vai ter de gastar dinheiro nas emergências, quando o mundo vier abaixo e não houver o que prevenir, só remediar.
Mas tudo bem, o carioca é um ser versátil e se adapta a tudo. Tanto que os assaltantes já descobriram uma maneira no mínimo criativa para, como eles dizem, "fazer um ganho": atacando os indefesos motoristas retidos nas enchentes.
Haja reza.

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