São Paulo, domingo, 14 de janeiro de 1996
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Hortência mãe decide virar 'cartola'

EDGARD ALVES
DA REPORTAGEM LOCAL

Com dez quilos a mais do que na sua época de atleta, quando pesava 58 kg -tem 1,74 m de altura-, Hortência está ansiosa.
"Não vejo a hora de poder carregar meu filho nos braços."
O nome do menino já está escolhido: João Victor Marcari Oliva.
A operação cesariana está programada para o dia 2 de fevereiro, na maternidade Pro Matre, em São Paulo, sob os cuidados do médico Marcelo Zugaibe.
O enxoval da criança também está pronto, bem como o mimo (um bonequinho de fraldas, com gravata borboleta, simbolizando o pai empresário, e com uma bola de basquete, lembrando a mãe) que será oferecido aos amigos e familiares após o nascimento.
Neste último mês de gravidez, Hortência manteve as suas atividades normais, embora tenha reduzido o ritmo.
Nesta entrevista, ela assegura que sua decisão de encerrar a carreira de jogadora foi "bem pensada" e que não deve retornar à seleção brasileira que participará dos Jogos Olímpicos de Atlanta, em julho.
Ela continua ligada ao basquete como diretora ("cartola") da equipe feminina do Seara, de Paulínia (120 km ao norte de São Paulo).
"Esse trabalho depende muito de contato. Faço muita coisa pelo telefone", disse.
Também assessora a Confederação Brasileira de Basquete na elaboração do plano de preparação da seleção nacional para a Olimpíada.
Faz parte de seus planos acompanhar a delegação na viagem a Atlanta, mas como "cartola".
Outra atividade que mantém é sua participação nas reuniões do Indesp (Instituto Nacional de Desenvolvimento do Desporto), braço operacional do Ministério Extraordinário dos Esportes.
*
Folha - Há motivo especial para a opção antecipada por uma operação cesariana?
Hortência - Tenho medo de sentir dor. Se dá para evitar a dor, fiz essa opção. Atleta é diferente de uma pessoa normal. Já senti muita dor curando contusões. Passei muitas noites em claro, fazendo tratamento, para poder jogar no dia seguinte. Agora, quero mesmo é ver meu filho no meu braço.
Folha - Por que você escolheu o dia 2 de fevereiro e o horário das 11h30 (12h30, horário de verão)?
Hortência - O mais provável seria 7 ou 8, e eu poderia antecipar em até uma semana. Simpatizei com 2. Sempre existe o risco de nascer antes. Vou ao médico toda semana.
Você fez alguma consulta de mapa astral?
Hortência - O José Victor faz mapa astral. O astrólogo indicou vários dias com os horários mais indicados. O dia 2, entre 11h33 e 11h38 é o melhor horário, tem lua cheia, que sempre prenuncia vida de plena expressão, dia de Iemanjá. Escolhi o 2.
Folha - O menino será aquariano. Você é ligada em signo?
Hortência - Não entendo nada. Todos falam bem de aquarianos. Eu nasci em 23 de setembro, sempre achei que era Libra, mas o astrólogo disse que nasci às 5h e sou Virgem. O José Victor é Peixes.
Folha - Tem feito algum tipo de ginástica especial?
Hortência - Específica para a gravidez, não. Fiz ginástica normal quando fiquei grávida. Com sete meses parei de fazer. Fiz um pouco de natação, caminhada, musculação leve e bicicleta. Parei agora porque está difícil de se movimentar.
Folha - Qual foi o melhor conselho que você ouviu durante a gravidez?
Hortência - Não lembro de nenhum. Na verdade, ouvi muita bobagem. Recebia um conselho aqui e, logo ali, outro exatamente contrário ao primeiro.
Folha - Você imagina um filho atleta, como a mãe, ou empresário do ramo de restaurante e casa noturna, como o pai?
Hortência - Não tenho nada pensado. Vai escolher o caminho que quiser. Um sonho seria ele tocar piano. Na verdade, a gente pensa um monte de coisas, mas no fundo o interesse é ter saúde. Vai fazer natação, judô, tênis, com certeza, mas como lazer. No esporte é legal o ambiente.
Folha - Como atleta, você teve 20 anos de uma vida agitada, com treinos, jogos e viagens. Substituiu tudo isso na gravidez. Como a sua cabeça reagiu?
Hortência - Impressionante como foi uma coisa bem pensada. Feita no momento certo. Não parei de jogar por causa da gravidez. Já tinha decidido parar porque tinha perdido o encanto.
Folha - Explique melhor.
Hortência - O basquete exige que você esteja sempre determinada. Já não era a coisa mais importante da minha vida. A confusão é que dei a notícia da gravidez junto com a da saída definitiva do basquete.
Mas foi uma coisa bem resolvida. Não sinto vontade de jogar. Por enquanto, não senti nada. Estou feliz pela decisão e contente por não estar sofrendo.
Folha - O que você perdeu e o que você ganhou deixando de ser atleta?
Hortência - Acho que só ganhei. Veja bem, as pessoas me reconhecem, continuam me respeitando. Perdi apenas a convivência diária que tinha com as companheiras. Eram seis ou sete horas com as meninas.
Folha - Como está o seu trabalho na direção do time feminino do Seara? Ou você pensa em ser treinadora?
Hortência - Não penso em ser treinadora. O que me cansou no basquete foram as seis horas diárias que sempre passei dentro da quadra. Para ser treinadora teria de ficar de novo na quadra. Quero outras coisas, mexer com basquete e projetos particulares.
Como dirigente, tenho tempo. Negocio patrocínio, faço contatos, conheço pessoas. Não vou ganhar nunca o que ganhava como jogadora, mas antes só tinha tempo para ser jogadora.
Folha - Especula-se sobre seu retorno ao basquete e à seleção na Olimpíada. Você voltará?
Hortência - O fim da carreira foi bem pensado. Acho muito, muito difícil voltar à seleção.
Meu filho vai estar pequeno e quatro meses é pouco tempo para recuperar a forma para o basquete.
Sempre quis jogar dentro do meu melhor estado atlético. Não quero que vejam a Hortência jogando mal.
Folha - Você irá a Atlanta como assessora da seleção? Como está o seu trabalho na Confederação Brasileira de Basquete?
Hortência - Vou, mas não ficarei na Vila Olímpica. Vou estar com meu filho. Vou como diretora do basquete feminino e me hospedarei em hotel. Já está decidido.
Folha - O Brasil é campeão mundial. A seleção tem chance de medalha de ouro nos Jogos Olímpicos?
Hortência - Acho muito difícil, mas não é impossível como antigamente. Dentro dos EUA, o time da casa é franco favorito. O torneio vai ser muito equilibrado.
Fui ao Mundial e não estarei no time olímpico. Em compensação, o Brasil vai jogar com reforços que não estiveram no Mundial, como a Silvinha, a Marta e a Branca.

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