São Paulo, quarta-feira, 17 de janeiro de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Raytheon contesta as críticas ao Sivam

LUCAS FIGUEIREDO
ENVIADO ESPECIAL AO RIO

A Raytheon classifica de "bobagens" as críticas ao projeto Sivam (Sistema de Vigilância da Amazônia). A empresa vencedora do contrato de US$ 1,4 bilhão não vê irregularidade alguma no projeto e diz que o Sivam é uma "invenção" da Aeronáutica.
A Raytheon defende nova concepção para o desenvolvimento da Amazônia, baseada no uso da alta tecnologia. James Carter, vice-presidente da empresa, e Carlos Gonzaga, diretor técnico, rebatem as denúncias contra o projeto, atacam a imprensa e os senadores Gilberto Miranda (PMDB-AM) e Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA).
*
Folha - A Raytheon foi condenada pelo juiz federal Albert Bryan Junior a pagar multa de US$ 1 milhão por obter de forma ilegal documentos secretos da Força Aérea dos EUA.
James Carter - Foi um caso com um empregado da Raytheon, na Virgínia. Ele é quem foi condenado e está preso. O governo norte-americano disse que a Raytheon não tinha culpa no processo e nenhuma punição foi aplicada.
Folha - Foi feito o pagamento da multa de US$ 1 milhão?
Carlos Gonzaga - A Raytheon foi multada em US$ 10 mil, porque era um empregado que tinha praticado o ato criminoso. O restante, que completa US$ 1 milhão, foram as custas do processo.
Carter - Houve alguns casos semelhantes. Representam menos de 1% dos contratos da empresa. Nunca houve qualquer alegação de má-fé ou atividade criminosa.
Folha - Se houve acordo, por que houve questionamentos por parte do governo dos EUA. Isso não pode ocorrer com o Sivam?
Carter - O que é preciso não esquecer é que houve uma concorrência para o Sivam. E nós apresentamos o menor preço.
Gonzaga - Nós tínhamos a melhor proposta técnica, o menor preço e o melhor financiamento. Nós fomos melhores em tudo.
Folha - Uma lei dos EUA proíbe empresas de subornar autoridades em outros países. Ao financiar viagens em jato particular para o então chefe do cerimonial do Planalto, Júlio César Gomes dos Santos, o representante da Raytheon no Brasil, José Afonso Assumpção, não estaria cometendo suborno?
Carter - Quando isso aconteceu a Raytheon já tinha o contrato assinado.
Gonzaga - A Raytheon jamais autorizou qualquer pessoa a fazer qualquer tipo de pagamento e tem certeza de que seus representantes nunca fizeram isso. José Afonso Assumpção é amigo do embaixador e convidou-o para uma viagem. Outra falha é dizer que houve uma festa da Raytheon nos EUA. Foi uma feira de aviões.
Carter - Não acredito que o governo norte-americano tenha interferido no processo.
Folha - Por que então o embaixador dos EUA, Melvyn Levitsky, disse que as relações entre os países ficariam abaladas caso o contrato fosse anulado?
Carter - Houve uma concorrência. Nós vencemos. Não fizemos nada errado. O governo norte-americano apóia o governo brasileiro nas suas ações do Sivam. Tanto que vieram as empresas dos EUA e o Eximbank financia o projeto.
Folha - Por que o Sivam é importante para o Brasil?
Carter - Pelo conjunto de benefícios que o Sivam pode proporcionar no controle ambiental, no zoneamento ecológico, climatologia, meteorologia, geração de informações sobre desenvolvimento agrícola, combate ao narcotráfico e controle de tráfego aéreo.
Folha - Esse é um dos contratos mais caros do mundo. Não seria exagero para um país com tantos problemas sociais?
Carter - O Sivam trará uma capacidade muito grande para o uso de mais da metade de seu território. Apresentamos o menor preço.
Folha - Mesmo que pelo menor preço, este é um contrato que nem o governo dos EUA fez igual. Não é um contrato elevado para um país como o Brasil?
Gonzaga - É importante olhar os benefícios que o programa vai gerar. As instituições brasileiras, tipo Ibama e Funai, não têm muitos recursos e não têm como gerenciar bem esses recursos. A evasão de minério representa riqueza que está saindo. O Sivam é uma infra-estrutura que vai permitir às autoridades otimizar o seu uso.
Folha - Para utilizar essas informações não serão necessários investimentos tão grandes quanto o Sivam. O sr. citou o Ibama e a Funai, mas eles não têm pessoal, carros, combustível.
Gonzaga - O problema que existe, existe. Se não tiver nenhuma gasolina, o Sivam não serve para nada. Mas se tiver um pouco de gasolina, o sistema passa a otimizar seu emprego. O que se vai fazer é conseguir utilizar melhor os parcos recursos. O que o Sivam vai fazer é que se precise menos de estradas, helicópteros e recursos. Com a infra-estrutura de telecomunicações do sistema, o custo que iria ter com um acidente de picada de cobra fica muito menor porque o médico não precisa ir no local. Ele vai falar com aquele local pela rede de telecomunicações.
Folha - Ou seja, a alta tecnologia na área de comunicações pode ser um novo modelo de desenvolvimento da Amazônia.
Gonzaga - Exato. Quem inventou o Sivam não foi a Raytheon. Essa concepção foi feita pelo Ministério da Aeronáutica.
Folha - Por que este projeto é tão polêmico?
Carter - O programa não é complicado. O que tem aparecido são informações distorcidas.
Gonzaga - E tem havido nessas informações distorcidas uma focalização não dos benefícios do projeto ou o que é o Sivam, mas em questões limitadas, por exemplo, a alguns sensores. Alguns relatórios têm mostrado discussões intermináveis sobre tecnologia OTH (Over the Horizont) e nós já mostramos que não serve para o Sivam. A Raytheon é a maior fabricante do mundo de OTH e teria o maior interesse de vender OTH. A gente tem tido o professor Rogério Cézar de Cerqueira Leite (físico e membro do conselho editorial da Folha) atacando isso o tempo todo. Ele disse que o OTH é aeroembarcado. O avião do professor Cerqueira Leite, para colocar isso aeroembarcado, tinha de ter um transmissor do tamanho de Copacabana, outro avião do tamanho de Ipanema e Leblon, e só para levar o gerador ele precisaria de outro avião do tamanho do Maracanã. Eu me envergonho de ver um engenheiro do ITA (Instituto Tecnológico da Aeronáutica) dizendo essas patocas e bobagens. E tem mais: tudo isso não representa 10% do sistema.
Carter - Este é um exemplo perfeito. Esse é um caso que acontece com a Folha. Continuam sendo publicados de novo, de novo e de novo artigos sobre o OTH, os quais qualquer análise técnica rápida conclui que esta não é a tecnologia certa para fazer o trabalho que o Sivam tem que fazer.
Gonzaga - O senador Gilberto Miranda fez um relatório sobre o Sivam e falava só do OTH. E é muito interessante que ele foi aos EUA e pediu para visitar a Raytheon e conversar sobre o OTH. Nós mostramos o sistema e o porquê de não propormos o OTH. Ele ficou convencido de que não servia. Retornou ao Brasil e fez um relatório estranho, diferente daquilo. Absolutamente, não serve. E a Folha, por exemplo, traz isso constantemente, traz o OTH. Então a gente já está cansado de dizer isso todo dia.
Folha - O fato é que o projeto tem muitos adversários. A quem interessa que não haja o Sivam?
Carter - Na verdade, nós não sabemos.
Gonzaga - Eu gostaria de perguntar para a Folha porque a Folha faz isso.
Folha - O senador Antônio Carlos Magalhães afirma que a escolha da Raytheon foi um jogo de cartas marcadas porque a Esca tinha um acordo com a Raytheon para trabalharem juntas.
Carter - Era somente uma carta de intenções, que foi posteriormente cancelada. A Esca também havia trabalhado com outras empresas que concorriam. O senador está enganado.

Texto Anterior: Subcomissão aprova emenda que cancela verba para Sivam em 96
Próximo Texto: Físico responde a vice-presidente
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.