São Paulo, quarta-feira, 17 de janeiro de 1996
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Livro possui erotismo mais latente

CELSO FIORAVANTE
DA REDAÇÃO

O filme "O Carteiro e o Poeta" é baseado no livro "Ardente Paciência", do escritor chileno Antonio Skármeta, já lançado no Brasil pela editora Brasiliense.
O crescente sucesso do filme faz com que o livro seja relançado no Brasil na primeira quinzena de fevereiro, agora pela Record, com o mesmo título do filme.
Em entrevista à Folha por telefone, de Santiago, sua cidade natal, Skármeta falou da produção do filme, de erotismo e de poesia.
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Folha - Como foi o processo de adaptação do livro "Ardente Paciência" para o cinema?
Skármeta - O livro "Ardente Paciência" já foi publicado em 15 idiomas, inclusive português. O ator Massimo Troisi leu o livro em italiano e se apaixonou pela figura do carteiro.
Falou então com o produtor Vittorio Cecchi Gori e pediu que ele o financiasse, já que considerava o carteiro o personagem de sua vida. Pediu também a Cecchi Gori que contratasse o inglês Michael Radford, pois seu filme "Another Time, Another Place" o havia impressionado muito.
Folha - A adaptação que o sr. fez de seu livro é muito diferente desta feita por Radford?
Skármeta - A minha adaptação foi feita para televisão, com um orçamento muito pequeno, com atores chilenos de teatro, e a ação, como no livro, se passa no Chile. O filme tem um orçamento maior, tem estrelas mundiais de cinema e se passa na Itália. Mas a maioria dos diálogos e o espírito da obra estão presentes. Eu gosto muito de "O Carteiro e o Poeta".
Folha - Em seu livro, o carteiro tem 17 anos. No filme, ele deve ter cerca de 35. Esta diferença de idade não indica uma diferença muito grande na relação dos personagens com a poesia?
Skármeta - Radford enfatizou as características de um homem que está preso em sua rotina e que necessita outro mundo, outra relação, precisa voltar-se para si mesmo e crescer. É um homem mais maduro, com outro tipo de problema, mas que não perdeu a curiosidade juvenil. Nesse sentido, o diretor conseguiu definir bem a psicologia do personagem.
Folha - Seu livro é carregado de erotismo. Mesmo nos momentos mais banais, está presente, e não apenas nos momentos de desejo e de poesia. O erotismo é importante para a eficácia do discurso poético?
Skármeta - Acredito que sim. Acho que quanto mais sensual e erótico seja o discurso, mais ele estará próximo da vida. Gosto de todas as obras, e todos os temas da grande tradição cultural mundial estão encarnados na vida cotidiana das pessoas. E a vida cotidiana está sempre carregada de paixão, sensualidade... Esta combinação me agrada: filmes e livros que tenham uma visão transcendente -do tipo filosófico, estético e político-, mas que tenham suas raízes na vida cotidiana.
Folha - Mas, no livro, o erotismo é latente. Já no filme, o erotismo é sublimado...
Skármeta - Quando li o roteiro, vi que os jogos eróticos haviam desaparecido, e Radford me disse que queria fazer um filme muito realista, asséptico, apenas com aquilo que era possível em um pequeno povoado italiano nos anos 50. Não seria possível usar toda a turbulência latino-americana que o livro possui.
Folha - O livro tem aspectos biográficos?
Skármeta - "Ardente Paciência" não é biográfico, mas, como nele, a poesia de Pablo Neruda foi muito eficaz para eu conquistar garotas. Os movimentos das mãos se misturavam com as palavras do poeta.

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