São Paulo, sábado, 20 de janeiro de 1996
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ONGs querem suspender doação em protesto

EMANUEL NERI
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma doação de US$ 20 milhões do governo alemão para demarcação de terras indígenas será o principal alvo de campanha internacional para que Fernando Henrique Cardoso revogue o decreto que permite alterações nos territórios já demarcados para os índios.
A campanha será coordenada pelo Conselho de Articulação das Organizações dos Povos Indígenas do Brasil. A entidade reúne cerca de cem ONGs (organizações não-governamentais) de defesa dos direitos dos índios. O Ministério da Justiça não quis se manifestar a respeito.
As ONGs pró-índios estão convidando a índia guatemalteca Rigoberta Menchú, prêmio Nobel da Paz de 1992, para vir ao Brasil. O objetivo é a participação dela nas pressões contra o governo.
A decisão sobre a campanha internacional foi tomada em reunião anteontem, em Brasília. O dinheiro alemão faz parte de um acordo de cooperação financeira assinado em outubro do ano passado, pelos governos do Brasil e da Alemanha.
Além dos US$ 20 milhões, há mais US$ 2 milhões que serão financiados pelo Banco Mundial. O Brasil ainda não recebeu nenhuma parcela desse dinheiro. As ONGs vão pedir que a doação seja suspensa imediatamente.
"Não queremos que esse dinheiro sirva para demarcar terras indígenas que posteriormente possam ser revistas e reduzidas pelo governo", diz Lídia Luz, da Comissão Pró-Índio, que integra o Conselho dos Povos Indígenas.
A campanha externa contra o governo brasileiro será feita em várias frentes. As ONGs pró-índios vão despachar uma delegação para falar com o governo alemão e com o G-7, o grupo dos sete países mais desenvolvidos do mundo.
Ainda no exterior, serão mantidos contatos com entidades de defesa dos índios. A Survival International, maior ONG indígena da Inglaterra, já enviou carta a Helmut Kohl, primeiro-ministro alemão, pedindo para pressionar o governo brasileiro e rever o financiamento para demarcações.
As queixas também serão levadas à ONU (Organização das Nações Unidas), OEA (Organização dos Estados Americanos) e Banco Mundial. No Brasil, as ONGs vão visitar os embaixadores de países do G-7 e da União Européia.
O primeiro embaixador a ser visitado é o da Alemanha, provavelmente na próxima segunda-feira. Para as ONGs, a Alemanha é o país mais preocupado com os índios brasileiros. Em segundo lugar, vem a Holanda.
Pressão interna
No Brasil, as ONGs agem em várias frentes para convencer o governo a rever o decreto. O governador do Amapá, João Capiberibe (PSB), aderiu à campanha, em carta enviada ontem ao presidente Fernando Henrique. Cerca de 10% dos de 104 mil km² do Amapá são terras indígenas.
Capiberibe diz que o decreto de FHC beneficia "pessoas interessadas nas áreas indígenas". Afirma que, se a medida não for revogada, os direitos indígenas "voltam a ser vulneráveis, o que causaria um retrocesso" para os índios.
Em Brasília, as ONGs protestaram ontem contra o fato de a Funai se recusar a receber um grupo de 20 índios que queria entregar um manifesto contra o decreto. O presidente da Funai, Márcio Santilli, estava viajando.

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