São Paulo, segunda-feira, 22 de janeiro de 1996
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Brasil paleolítico

Entre os fatores que caracterizam um país subdesenvolvido, como o Brasil, está o contraste clamoroso nos níveis de vida da população. O exemplo das famílias que habitam em cavernas, na fronteira do Piauí com o Ceará, mostra que subdesenvolvido e injusto são conceitos suaves para definir a nação.
O fato de famílias viverem, há mais de uma geração, quase como homens do período paleolítico desafia qualquer aspecto que possa sustentar um perfil minimamente moderno e igualitário da sociedade. Para esses poucos lavradores, o fogo ainda é uma arma vital.
Enquanto em partes do país a agroindústria produz para o mercado externo com padrões internacionais, esses trabalhadores cultivam apenas o minimamente necessário para a sobrevivência de suas famílias. O "homem das cavernas" brasileiro convive ainda com cobras dentro de sua precária moradia sem ter muito o que fazer para evitá-las.
Enquanto alguns reclamam do exíguo espaço dos apartamentos modernos, estes moram entre fendas de rochas, encolhidos pelo teto baixo, ameaçados por desabamento e sem o menor instrumento que permita identificar traços de uma habitação do século 20. Não dormem sobre camas, mas sobre jiraus. Caneta, xampu e sabonete são seus objetos de desejo.
Para um país que enfrenta sérias contradições sociais, os habitantes das serras da Ibiapaba e Grande retratam de maneira mais impressionante o quanto são profundas as disparidades nacionais. Não se trata de tornar esse caso, chocante mas localizado, um emblema nacional. Ainda assim, ele está a lembrar o quanto ainda tem de ser feito para chegar à modernidade.

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